TERRITÓRIOS INVADIDOS

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Em demarcação, TI do Rio Caeté já é alvo de caçadores e madeireiros em Sena Madureira

Rastros da destruição: madeiras derrubadas e serradas por madeireiros dentro da Resex Cazumbá-Iracema, em área que formará a futura TI Jaminawa do Alto Rio Caeté (Foto: Cedida)



Expedição realizada em março por GT responsável por demarcação encontrou toras derrubadas e madeiras serradas; indígenas também denunciam invasão constante por caçadores cuja prática coloca em risco a segurança alimentar da comunidade.



Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco


O povo Yaminawa do rio Caeté, no município de Sena Madureira, ainda nem teve seu território oficialmente demarcado pelo Estado, mas já é impactado pela ação de caçadores e madeireiros ilegais. Durante trabalho de identificação em campo dos limites da terra indígena, os Jaminawa e a equipe técnica do Grupo de Trabalho (GT) criado para conduzir o processo de demarcação da Terra Indígena Jaminawa do Alto Rio Caeté encontraram árvores cortadas, bem como madeira já devidamente serradas e prontas para ser comercializada.

Além disso, os Yaminawa relatam a invasão constante de caçadores para a matança de jabutis, jacarés e outras espécies. Toda a carne consegue chegar sem nenhuma dificuldade ao mercado de Sena Madureira. O mais interessante é que todos estes crimes acontecem em terras que hoje formam a Reserva Extrativista (Resex) Cazumbá-Iracema, unidade de conservação federal. A gestão da UC é de responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio).

Enquanto o processo de demarcação da TI Jaminawa do Alto Rio Caeté não é finalizado – a última fase é a homologação em decreto assinado pelo presidente da República – o território reivindicado pelo povo indígena permanece sobreposto à Resex Cazumbá-Iracema. Os Yaminawa de Sena Madureira estão há quase duas décadas à espera da demarcação. No município, outro território na fila da demarcação é a Ti Riozinho do Iaco, pleiteada por Yaminawa e Manchineru.

Por conta da omissão do poder público, estes territórios convivem com pressões e ameaças contínuas das invasões de madeireiros e caçadores, além da grilagem de terras.

Em novembro do ano passado, a juíza Luzia Farias da Silva Mendonça, da Segunda Vara Federal de Rio Branco, negou pedido de indenização no valor de R$ 40 milhões, de uma família que afirma ser proprietária do Seringal Boa Vista – que mediria 3.000 hectares – cujos limites foram incorporados pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) à Ti Jaminawa do Alto Rio Caeté.

A magistrada, todavia, seguiu o parecer emitido pelo Ministério Público Federal (MPF) no qual afirma não haver garantias nem segurança jurídica para provar a posse do seringal pela família, o que não daria a ela direito de indenização por desapropriação.

No caso, o possível pagamento deveria ocorrer apenas por benfeitorias de boa-fé feita na área, o que também não foi comprovado. Em sua manifestação, o MPF afirma haver fortes indícios da prática de grilagem pelos proprietários do Seringal Boa Vista.

Aguardando demarcação desde 2007, a Ti Jaminawa do Alto Rio Caeté teve seu processo retomado em abril do ano passado, quando a Funai criou o GT.

Tapiris e destruição

Toras de copaíba e massaranduba foram encontradas por Yaminawa durante expedição (Foto Cedida)

Durante a Expedição Kanamari, realizada na última semana de março, o GT se deparou com tapiris feitos por caçadores e madeireiros. Eles usam as construções como ponto de estadias durante suas ações no meio da mat. “É por isso que queremos a demarcação o mais rápido possível. Todo ano eles vêm fazer caçada e quebrar castanha. Pelo jeito vindo muita gente. Um tapirizão desse é uma casa”, denuncia a liderança Lauro Nunes Jaminawa.

“Esses invasores está acabando com a nossa alimentação. Tem muita gente que vem até de Rio Branco caçar pra cá, porque tem uns filhos, netos, parentes que moram em Sena, então eles aproveitam quando vêm de férias pra caçar pra cá. Eu já ouvi um médico falando que ia tirar as férias pra caçar pra dentro do Kanamari”, denuncia a liderança Chico Macaxeira Jaminawa.

Aquela era a primeira vez que os próprios Yaminawa entravam naquela área, enquanto ela é costumeiramente invadida por caçadores e madeireiros. “Aqui já ouvimos falar que levam de 50 a 100 jabutis. Passam de um mês, 15 dias por aqui. Levam muita carne”, completa ele. “Por isso nós queremos marcar logo a nossa terra pra ver se nós temos segurança, porque se não daqui uns dias vai se acabar com tudo e não vai sobrar nada pra nós.”

“É muita destruição de madeira aqui. O ICMBio não vendo essa destruição? com seis toras de massaranduba derrubada aí e não sei quantas estacas. Isso daí o ICMBio deveria pelo menos fiscalizar a terra, né? Todo ano esse pessoal tira madeira, rapaz”, queixa-se Antônio Koruma Jaminawa.

De acordo com o líder Yaminawa, toda a madeira extraída é levada para ser vendida em Sena Madureira. “Eu vejo muita gente que sai daqui com barco cheio de madeira, coberto de lona, batelão grande que vem pra cá e o ICMBio não vê isso. No local, conforme os relatos, além das toras de massaranduba derrubadas estavam os acampamentos de quem trabalhou nas derrubadas.

A construção dos tapiris bem estruturados é um claro sinal da sensação de impunidade por parte de quem comete os crimes dentro da futura TI Jaminawa do Alto Rio Caeté.

Estruturas de tapiris construídos no meio da mata por caçadores e madeireiros (Foto Cedida)

Outro lado

Procurada por Varadouro, a Funai, como lhe é comum, não respondeu à reportagem. Já o ICMbio diz desconhecer a atuação de madeireiros dentro da Resex Cazumbá-Iracema. Sobre os caçadores, afirma manter fiscalizações constantes em parceria com outras instituições para inibir o crime.

“Em relação à atividade de extração de madeira na Resex Cazumbá-Iracema, a equipe do ICMBio está ativamente presente na unidade e não houve registros dessa atividade. O Instituto tem conhecimento de ocorrências de caça ilegal na Resex ao longo do tempo.”. Porém, a Expedição Kanamary mostra o inverso.

“As ações de fiscalização são realizadas de forma constante ao longo do ano, principalmente ao longo das rotas dos rios Caete e Macauã”, diz nota do ICMBio.

“A equipe de apoio é composta por 19 agentes, incluindo policiais do Batalhão Ambiental da Polícia Militar do Acre, fiscais do ICMBio e agentes temporários ambientais. Ao todo, três embarcações do tipo voadeira são utilizadas nas operações.”

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