Rio Madeira abaixo de 2m50 em Porto Velho; interior de Rondônia vai perfurar poços
Boletins do Serviço Geológico do Brasil (ex-CPRM) apontam volume de água abaixo do normal para o atual período do ano em toda a Bacia do Rio Madeira. Em algumas localidades do interior de Rondônia já se estuda a perfuração de poços, o que evitaria o colapso no sistema de abastecimento, como aconteceu em 2023. A geração de energia pelas usinas do Madeira também pode ser comprometida. Sul da Amazônia Ocidental ainda tem dois meses de seca severa pela frente.
Montezuma Cruz
Dos varadouros de Porto Velho
Abaixo dos 2m50, o nível do Rio Madeira angustia a capital ainda mal acostumada ao desperdício de água. No interior, Incra e Serviço Geológico do Brasil estimulam a perfuração de poços para evitar a repetição de 2023, quando faltou água para o abastecimento domiciliar, especialmente nas cidades de Cacoal e Espigão do Oeste. No ano passado, a crise afetou diversos municípios. No ano passado em Espigão do Oeste o Rio Palmeiras secou completamente. Naquela ocasião, a Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia valeu-se de carros-pipa do Departamento de Estradas de Rodagem.
A última semana de julho de 2024 é um alerta, vê o pesquisador em geociências Marcus Suassuna Santos, do Sistema de Alerta Hidrológico da Bacia do Rio Madeira. Segundo os boletins por ele assinados, todos os pontos de monitoramento apresentaram redução de nível, “abaixo da normalidade para este período do ano.”
Na Capital e no interior, a estiagem também traz a baixíssima umidade e temperaturas elevadas: 34 a 35º, com máxima de 39º em Corumbiara, no sul do estado,a quilômetros de Porto Velho. “Os trechos de Porto Velho e Jirau-Jusante Beni têm o nível mais baixo registrado no histórico”, assinala Santos.
Dirigentes da Superintendência Estadual do Incra e do Serviço Geológico reuniram-se na semana passada para avaliar a necessidade de atender à população rural com a perfuração de poços. Segundo informam, as famílias utilizam água de rios e nascentes em suas atividades de sustento e preservação ambiental.
O Incra informou à equipe do Serviço Geológico a dependência desse sistema, “para pequeno uso”, devido a projetos da agricultura familiar, produção de hortas, criação de animais e piscicultura. Cada área será estudada pela Superintendência, para o devido cumprimento das normais e condições legais.
O banco de dados (GeoMaps ANP) explica corretamente ao usuário como acessar e consultar onde há poços atrsianos e locais permitidos para perfuração. “É uma operação é muito simples, mas exige que o produtor preste todas as informações para que sua solicitação seja atendida”, diz a servidora Suelen Lucena, do Serviço Geológico. Mas qualquer perfuração sem autorização do órgão competente resultará em multa por crime ambiental, ato sujeito a prisão.
Para o superintendente do Incra em Rondônia, Luís Flávio Carvalho Ribeiro, a crise hídrica é real e implica planejamento. Desta maneira, ele vem anotando todos os lotes dos assentamentos que necessitam de poços.
Prefeituras estão apelando à Caerd. Em Santa Luzia d’Oeste, na Zona da Mata rondoniense, o gerente de suporte de gestão e negócios da Companhia, Claudecimar Ferreira dos Santos, e o operador de ETA, André Nogueira, acompanharam o prefeito Jurandi de Oliveira e assessores até o leito do rio Bambu, principal ponto de captação de água da cidade. Começaram a avaliar a área depois que o nível do manancial ficou abaixo da marca, comparado ao mesmo período do ano passado.
O maior problema anotado é o assoreamento que também afeta toda a Bacia Amazônica. A CAERD apresentou ao prefeito o Plano de Urgência e Contingência elaborado pela empresa, a fim de minimizar os impactos da crise hídrica em Rondônia. O rio terá que se desassoreado urgentemente.
Em consequência da estiagem, rios rondonienses estão com escassez de água. Desde o início de julho, pelo Decreto nº 29.252, o governador Marcos Rocha declarou estado de emergência com vigência para 180 dias.
Repiquetes em agosto
A situação pode ser classificada de alentadora na atual tendência de o Rio Madeira continuar com a vazante em Porto Velho: segundo o Alerta Hidrológico analisa, existe previsão de chuva na Bacia do Rio Beni (na Bolívia) entre os dias 31 de julho e 8 de agosto. Isso ocorrendo, será possível haver repiquetes em Porto Velho em meados do próximo mês.
Além da falta de chuvas, o fogo faz aumentar o calor. É o caso do Parque Estadual Guajará-Mirim, em cujo território acontece atualmente um terço dos focos de calor em unidades de conservação na Amazônia este ano. Segundo o BDQueimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em apenas dois dias de julho, 23 e 24, a Amazônia teve 1.318 focos de calor, o dobro da quantidade de fogo, nesses dois mesmos dias no ano passado, quando foram notificados 671 focos, um aumento de 96%. E quase quatro vezes mais do que em 2022: nos mesmos dois dias houve 399 focos.
Muito mais calor
Essa situação já supera a de 2005. “Além de um recorde em quase 20 anos, o fogo na Amazônia nos sete primeiros meses do ano aumentou 43,2% em relação ao mesmo período de 2023 (14.116 focos de calor)”, avalia o especialista em campanhas do Greenpeace Brasil, Rômulo Batista.
Conforme Batista, a uma semana para o final do mês, o número de focos supera o total ocorrido em julho do ano passado: enquanto foram registrados 5.772 focos de calor de 1º a 31 de julho de 2023 na Amazônia, o período de 1º a 24 de julho deste ano já soma 6.732 focos.
“O louco que preservou”
Em meio aos fenômenos climáticos, a organização ambiental Ação Ecológica Guaporé (Ecoporé) traz notícia alvissareira ao revelar o êxito do agricultor familiar Arildo Ferreira, um de seus parceiros: “Ele começou a recuperar a beira de um córrego em seu sítio que possui 40% de mata nativa preservada, foi até chamado de louco por vizinhos, mas quem vê a mata ciliar dele avalia a alegria dele e da família.”
Destruída, a mata ciliar se restabeleceu e com isso Arildo pôde melhorar a qualidade do café, e ainda inaugurou uma torrefação própria.
Segundo a Ecoporé, o reflorestamento melhorou as condições da água do córrego. Arildo contou: “Quando a gente vai beber, a gente gosta daquela água bem fresquinha, e as plantas também gostam disso.” A água do córrego agora chega fresquinga à plantação.
Arildo e outros agricultores foram parceiros beneficiados pelo projeto Águas do Pirarara, realizado pela Ecoporé e patrocinado pelo Fundo de Restituição de Bens Lesados do Ministério Público de Rondônia. Receberam assistência técnica especializada, material de isolamento, sementes e mudas necessárias para recuperar áreas de preservação permanente.
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NOTA: atualizado o nível do Rio Madeira às 15h30 de 29 de julho.