UMA PORTEIRA FECHADA

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Na Câmara, relator vota pela rejeição do PL da grilagem da Resex Chico Mendes




Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco

O deputado federal Airton Faleiro (PT-PA) votou pela rejeição integral do projeto de lei (PL 6024) que visa desafetar áreas da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, no Vale do Acre, e rebaixar a categoria do Parque Nacional da Serra do Divisor, no Vale do Juruá, para área de proteção ambiental (APA). O relatório do parlamentar paraense foi apresentado na sessão da Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais (Cpovos) da Câmara, realizada no último dia quatro. A rejeição ao PL da grilagem da Resex Chico Mendes – como ficou conhecida a proposta – ainda precisa ser votada pelos demais membros da Cpovos.

O PL 6024 foi apresentado em dezembro de 2019 pela então deputada federal Mara Rocha (PSDB), uma das líderes da bancada da motosserra à época. Todavia, a paternidade política e intelectual da proposta é atribuída ao senador bolsonarista Márcio Bittar (União), que até hoje trava uma ofensiva no sentido de fragilizar as políticas de proteção ambiental do país. O PL atende a um anseio de pequena parte dos moradores da Resex Chico Mendes cujas colocações já foram quase todas desmatadas e transformadas em fazendas para criação de boi. Ao todo o PL previa a desafetação de 22.188 hectares da unidade de conservação (UC) federal.

A simples apresentação do projeto é definida como o estopim para o início da devastação recorde pela qual a unidade de conservação federal passou nos últimos quatro anos. De acordo com dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a Resex Chico Mendes foi a área protegida mais ameaçada e pressionada pelo desmatamento entre agosto de 2022 a julho de 2023.

Segundo o Imazon, este é o sexto ano consecutivo em que a UC acreana ocupa a primeira posição entre as áreas protegidas mais ameaçadas pela devastação na Amazônia Legal. As análises do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que, entre 2019 e 2022, a Resex Chico Mendes teve mais de 307 km2 desmatados. É a quinta UC da Amazônia Legal com mais registro de desmatamento no período bolsonarista.

O comércio ilegal de terras (o fracionamento das colocações) feito pelos próprios moradores da UC é o que fomenta hoje o desmatamento e as queimadas. Muitas pessoas passaram a comprar lotes no interior da reserva com o objetivo de criar boi e abrir roçados. Grande parte destes “novos moradores” é formada por pessoas vindas de Rondônia. A perspectiva de regularização da posse, com a pretendida aprovação do PL 6024, alimentava a indústria da grilagem.

“A alteração dos limites da Reserva Extrativista é ir contra a todo o movimento de origem das Reservas Extrativistas, pois exclui os extrativistas e favorece os projetos agropecuários, conforme disposta na justificativa do presente projeto de lei que ressalta que a “flexibilização” dos limites da Resex é para permitir a criação de gado”, diz trecho do relatório do deputado Airton Faleiro.

Antes, ele discorre sobre o processo histórico e de lutas dos seringueiros acreanos para que se pudesse chegar ao modelo de criação das reservas extrativistas. Uma luta construída com muito sangue pelos seringais do Alto Acre. Entre as vítimas mais conhecidas destes embate (e empates) estão os líderes seringueiros Wilson Pinheiro, morto em 1981 em Brasileia, e Chico Mendes, assassinado em dezembro de 1988.



Serra do Divisor



Além da Resex Chico Mendes, o PL da bancada da motosserra também mirava outra importante UC da Amazônia: O Parque Nacional (Parna) da Serra do Divisor, no Vale do Juruá. Ao recategorizar o parque – unidade de proteção integral, com regras mais rígidas – para uma APA (mais flexível) os parlamentares tinham como objetivo retirar entraves ambientais para o projeto de construção da rodovia internacional entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa, a capital do departamento peruano de Ucayali.

Em seu parecer, Faleiro destaca a importância estratégica do Parna da Serra do Divisor não só para o ecossistema, mas para toda a população do Juruá: É considerado um dos locais com maior biodiversidade da Amazônia. “Várias espécies endêmicas vegetais e animais são encontradas devido, em parte, à sua proximidade com o ecossistema andino, numa região de transição das terras baixas da Amazônia e as montanhas dos Andes. Além disso, a Serra do Divisor não só guarda fauna, como protege a cabeceira de oito rios que são afluentes do rio Juruá.”

“A recategorização do Parque para APA, diminuindo a proteção da área, deve intensificar a invasão para exploração ilegal de madeira, favorecer o tráfico de drogas e às facções que vem tomando conta dessa região de fronteira”, finaliza o relatório, apontando outro grave problema da região, que é a forte presença de facções criminosas oriundas do Sudeste, interessadas em controlar a rota da droga produzida nas selvas peruanas.

Desde 2019, o Vale do Juruá também passou a registrar níveis considerados de desmatamento e queimadas – incluindo incêndios florestais. Estes impactos também são notados em áreas protegidas por lei, como o próprio Parna da Serra do Divisor, a Resex Alto Juruá e a Resex Riozinho da Liberdade.

Agora, com a rejeição da PL 6024, e a perspectiva de o voto ser aprovado pela maioria dos parlamentares da Cpovos, a tão pressionada Floresta Amazônica pode ter esperança de dias melhores – ficando de pé para assegurar a nossa sobrevivência num planeta cada vez mais em ebulição.



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