TÁ RUIM DE RESPIRAR

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Cidades acreanas têm uma das piores semanas em queimadas e poluição

Além de ocupar o terceiro lugar entre os municípios com maior número de queimadas no Acre, Cruzeiro do Sul também marca os piores níveis de poluição em setembro (Foto: Paulo Henrique Costa)




Cruzeiro do Sul teve um dos piores dias para se respirar, com a concentração de material tóxico sete vezes acima do recomendado pela OMS. Porto Acre foi o pior município nas análises. Para agravar, rios permanecem em vazante crítica. Do Alto Acre ao Alto Juruá os volumes registrados estão na casa dos centímetros, como em Brasiléia e em Porto Walter.



Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco

A semana que passou pode ser considerada uma das piores para a população acreana quanto aos impactos da seca extrema que atinge o estado desde meados de junho. Ao invés de diminuir, a prática das queimadas parecem ter aumentado nos últimos dias, contribuindo para a deterioração da qualidade do ar. Do Vale do Acre ao Vale do Juruá, a fumaça continuou (e continua) a encobrir as cidades. O caso mais grave aconteceu em Cruzeiro do Sul na última quarta, 11, quando a fumaça invadiu a cidade, levando à suspensão das aulas.

De acordo com análises feitas pelo Laboratório de Geoprocessamento Aplicado ao Meio Ambiente (Labgma), da Universidade Federal do Acre (Ufac), a pedido do jornal Varadouro, a concentração de material particulado (PM 2.5) em Cruzeiro do Sul ficou sete vezes acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O pior dia para os cruzeirenses respirarem foi na terça, 10 de setembro, quando a concentração de PM 2.5 alcançou 152 ug/m3 (micrograma por metro cúbico).

O recomendado pelas autoridades de saúde é uma exposição máxima entre 15 a 20 ug/m3 em 24 horas. Entre os 22 municípios acreanos, a capital do Juruá registrou a pior qualidade do ar. No dia 11 de setembro, a concentração de material particulado foi de 117 ug/m3. Desde o início do mês, conforme as análises do Labgama, Cruzeiro do Sul teve a maior parte dos dias com a qualidade do ar classificada como ruim, muito ruim e péssima. O município é o terceiro com mais detecções de focos de queimadas (veja abaixo).

Uma realidade impensável para a população do Vale do Juruá até anos atrás. Aos poucos, a devastação da Floresta Amazônica avança a passos largos pela BR-364 – como já mostrou este Varadouro.

A cidade com a pior qualidade do ar nestes primeiros dias de setembro é Porto Acre. Colado em Rio Branco, o município se caracteriza por ter uma das maiores áreas consolidadas para a agropecuária – o que explica a grande quantidade de queimadas para a limpeza de roçados e pastagens. O pior dia para se respirar na cidade foi sexta-feira, dia 6 de setembro, quando a concentração de PM 2.5 ficou em 277 ug/m3 – ou seja, 14 vezes acima dos padrões da OMS.

Dos 11 dias de setembros avaliados pelo Labgama, oito foram considerados como de qualidade péssima do ar para a população de Porto Acre. No período, Porto Acre foi classificado como o município menos recomendável do estado para se buscar um ar puro, livre da poluição tóxica das queimadas. A mesma situação foi enfrentada por Manoel Urbano e Sena Madureira. Estes dois já não são novidade, por desde 2019 apresentarem as maiores taxas de desmatamento e queimadas entre os municípios da Amazônia Legal – juntamente com Feijó.

Quarta, 11/9, foi considerado o dia mais crítico da fumaça em Cruzeiro do Sul. Na semana, concentração de material particulado ficou sete vezes acima do recomendado (Foto: Paulo Henrique Costa)


A capital acreana também não fica atrás quando o tema é a deterioração da qualidade do ar. Um grave problema que afeta com severidade os rio-branquenses desde 2019, quando as atuais forças políticas do estado iniciaram o processo de desmonte das políticas ambientais – deixando a porteira escancarada para a boiada passar.

Os dias de setembro têm sido terríveis para a população rio-branquense respirar. Todos são classificados como de qualidade muito ruim e péssima pelas análises dos sensores. O dia seis registrou a pior marca de PM 2.5 acumulada na atmosfera: 252 ug/m3. Na capital e em muitos municípios o cenário da poluição é agravado pelo calor intenso e a falta de água que afeta dezenas de comunidades – em especial as rurais. Sobra fumaça, falta água. A poluição deu um pouco de trégua com as pancadas de chuva registradas em pontos isolados.

De acordo com o programa BD Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), até 13 de setembro o Acre registrou 5.048 focos de queimadas. Neste mesmo período de 2023, foram 3.050 focos em 2024, os municípios campeões em detecção de queimadas são Feijó (1.288 F), Tarauacá (817 F), Cruzeiro do Sul (571 F), Manoel Urbano (377), Rio Brancco (334) e Sena Madureira (285).

Rios em níveis críticos

Na capital, o rio Acre está a 2 cm do nível mais crítico de vazante da história; um cenário de colpaso que ameaça segurança hídrica das comunidades (Foto: Gleilson Miranda/Varadouro)


À medida que os dias quentes e secos de setembro adentram, os rios acreanos permanecem em níveis críticos de vazante. O mais preocupante é o rio Acre. Conforme o último registro da Defesa Civil, o manancial marcou, em Rio Branco, 1,27 m nesta sexta-feira, 13 – ou seja, está a somente dois centímetros do volume mais baixo já registrado na história, que é de 1,25 m, ocorrido em 2 de outubro de 2022.

A situação é ainda mais crítica em Brasiléia, onde o rio Acre está com 78 centímetros. A pior marca em cinco décadas de medições. Isso, após o município registrar, em 28 de fevereiro,, a maior alagação de sua história , quando o rio alcançou volume de 15,58 m. Quem também está na casa dos centímetros é o rio Iaco, em Sena Madureira, com 36 cm. Em Santa Rosa do Purus, o rio Purus registra 1,10m.


LEIA MAIS: Seca deixa isoladas comunidades indígenas e ribeirinhas do Alto Juruá


Na Bacia do Juruá o cenário não é diferente. Em Porto Walter, o rio Juruá marcava 0,85 cm na sexta. Uma situação bastante oposta ao fim de fevereiro, quando o município foi atingido pela grande cheia do manancial. Mais acima, em Marechal Thaumaturgo, o Juruá apresenta a medição de 1,80 m. Cruzeiro do Sul encontra-se em cenário um pouco melhor, com o rio Juruá registrando 4,60 m – dois metros e sessenta acima da cota de alerta máximo. Porém, os relatos das comunidades ribeirinhas são de que, em muitos trechos, o manancial está em níveis tão críticos quanto às partes mais altas, o que prejudica a navegação.

O cenário ainda é de atenção máxima para os próximos dias e semanas, ante a tendência do prolongamento de um verão bastante severo. As previsões continuam de chuvas abaixo do normal pelo menos até o fim do ano. Situações que exigem uma resposta rápida e eficaz dos governos (todos eles) para mitigar os impactos sobre as populações amazônidas – em especial as mais vulneráveis.

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