RENOVAÇÃO DO PASSADO

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Velha direita dos tempos da bovinização reconquista hegemonia no Acre

O trio bolsonarista Gladson, Bocalom e Bittar: a consolidação da hegemonia política da direita reacionária no Acre (Foto: Assessoria)



Dos 22 municípios, 14 ficarão sob o controle do Progressistas, partido do governador bolsonarista Gladson Cameli, que levou o Acre a níveis recordes de desmatamento no primeiro mandato. Antes controlada pelo PT, Xapuri, a terra de Chico Mendes, também passa para controle da direita. Consolidação de grupo alinhado ao bolsonarismo ocorre em meio ao aumento de crimes ambientais e crise climática.


Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco

Os resultados das eleições municipais de 2024 podem ser definidos como a completa retomada da hegemonia política do Acre pela velha direita que conduziu os rumos do estado desde os anos de chumbo da ditadura militar (1964-1985), até 1999 – quando o PT chegou ao governo e ficou por duas décadas. O partido do presidente Lula não conseguiu eleger um único prefeito entre os 22 municípios acreanos – e ainda perdeu o controle de um simbólico: Xapuri, a terra do líder seringueiro Chico Mendes. A partir de 2025, a cidade passa a ser administrada pelo Progressistas, legenda do governador Gladson Cameli.

O PP, aliás, saiu como a grande força política da votação do último domingo, conquistando 14 prefeituras. Entre elas está Cruzeiro do Sul, a segunda maior cidade acreana, seguida por Sena Madureira, Tarauacá e Feijó (esta última reduto do petismo ano atrás). Em Rio Branco, o PP ocupará a vice-prefeitura ao lado do bolsonarista Tião Bocalom (PL), reeleito com folga no primeiro turno – derrotando uma frente ampla composta por partidos de centro-esquerda.

Se até bem pouco tempo a regional do Alto Acre era tida como uma território da esquerda e das forças mais progressistas – por ser o berço da luta dos seringueiros contra a invasão da Amazônia pelos “paulistas” – agora pode ser vista como reduto da direita ligada ao bolsonarismo. Dos quatro municípios, o PP saiu vitorioso em três. A exceção é Epitaciolândia, mas que está sob controle do PL de Jair Bolsonaro.

Prefeitos que nas eleições passadas foram eleitos pelo PT viraram a casaca e se filiaram ao PP. É o caso de Jerry Correia, em Assis Brasil, reeleito com 75% dos votos válidos. O único a manter lealdade ao petismo foi Bira Vasconcelos, em Xapuri. Todavia, não conseguiu fazer o sucessor e foi atropelado pela máquina do governo na cidade, que elegeu Maxsuel Maia (PP).

Vale destacar que é nesta região onde está concentrada grande parte da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, unidade de conservação criada a partir da luta dos seringueiros contra o processo de bovinização do Acre entre as décadas de 60, 70 e 80. Desde 2019, a Resex Chico Mendes passa por intenso processo de expansão da atividade agropecuária, que a levou a estar entre as áreas protegidas da Amazônia mais impactadas pelo desmatamento e queimadas.



ANÁLISE: Abuso no uso da máquina e conservadorismo explicam resultado das eleições no Acre

Há ainda movimentos políticos locais para o enfraquecimento dos sistemas de proteção e fiscalização. Entre eles, a apresentação do PL 6024, de dezembro de 2019, que prevê a desafetação de áreas da Resex Chico Mendes. O projeto tem apoio da classe política local, que aponta as normas ambientais para a preservação da floresta como um entrave e um atraso para o “progresso econômico do Acre” – discurso muito recorrente por estas bandas.

As Câmaras Municipais do Alto Acre foram palcos recorrentes para a realização de audiências públicas (entre 2019 e 2022) para legitimar apoio político e social ao PL 6024. Dos sete municípios abrangidos pelos 930 mil hectares da Resex Chico Mendes, todos estão sob gestão da velha direita acreana.

A mesma oligarquia de tempos passados que aponta o agronegócio e a flexibilização (por vezes a extinção) das normas ambientais como a “tábua da salvação” para todos os problemas econômicos do Acre. Foi com este forte discurso que, em 2018, Gladson Cameli foi eleito governador, pondo fim a 20 anos de hegemonia petista.

O prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom (PL), comemora reeleição com apoiadores; ele fez campanha ancorado no antipetismo reinante no Acre (Foto: Assessoria)



Extremos, de um extremo a outro

E essa consolidação da direita ligada ao reacionarismo de Jair Bolsonaro vai do Alto ao Baixo Acre. Em Acrelândia, o prefeito eleito se chama Olavinho Boiadeiro, do Republicanos. Localizado bem na divisa Amacro e formado a partir da colonização dos agricultores vindos do Sul, o município já possui amplas áreas consolidadas pela atividade agropecuária. O Vale do Acre concentra 70% de toda a área desmatada do Acre. Ao todo, o estado já perdeu 15% de sua cobertura florestal.

Esta consolidação da extrema-direita no cenário político acreano – e em parte expressiva da Amazônia Legal – ocorre em meio à intensificação dos eventos climáticos extremos. Do Alto Acre ao Alto Juruá, grandes inundações e secas severas afetam a vida das populações urbanas e rurais. Em Brasiléia, por exemplo, que em março teve 75% da cidade invadida pelas águas do rio Acre, agora vê o manancial numa marca abaixo dos 50 centímetros – isto quando já deveríamos ter as primeiras chuvas de nosso inverno amazônico.

E, assim, neste novo ambiente de incertezas climáticas, aumento das taxas de desmatamento e queimadas, crimes ambientais, poluição da fumaça, aumento dos níveis de pobreza, o Acre consolida sua guinada à direita. A reconquista do poder por aquela velha direita oriunda da ditadura militar que, ao sair do poder em 1998, deixou um Acre aos frangalhos e na lama da corrupção e dos escândalos. O mesmo cenário que se repete desde 2018, com a eleição de Gladson Cameli para governador, e sacramentado com as eleições municipais de 2024.

Como diria o saudoso jornalista José Chalub Leite: Tão Acre!

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