PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL

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O Incra, que no passado mandava desmatar, agora pagará pela floresta em pé

Além de garantir regularização ambiental de pequenos agricultores, projeto assegura compensação financeira a quem conciliar produção com a maniutenção da floresta em pé em Rondônia (Foto: Gleilson Miranda/Varadouro)



Adotando práticas de projetos de REDD+, que realiza a transferência de recursos a quem reduz os impactos de suas atividades sobre a floresta, projeto implementado pelo Incra beneficia famílias assentadas nos municípios mais críticos em desmatamento e conflitos em Rondônia. Os pagamentos variam de acordo com a quantidade de vegetação nativa da propriedade, começando em R$ 200 por hectare para quem tem até 80% de floresta preservadas.



Montezuma Cruz
Dos varadouros de Porto Velho

Durante as décadas de 1970 e 1980, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) só entregava o título de terra ao colono em Rondônia, se ele fosse casado em cartório e desmatasse 50% do lote ofertado. Essa exigência é atualmente lembrada em diversas teses acadêmicas que relatam a reforma agrária no país. Fazendo coro às exigências do milênio, a autarquia federal agora incentiva quem mantém a floresta em pé na Amazônia Legal, remunerando famílias de agricultores familiares.

Numa clara correção de objetivos e de resultados ambientais e de produção agrícola, quatro décadas depois da maior corrente migratória rumo à Amazônia, seis municípios do estado de Rondônia serão financeiramente recompensados pela conservação da floresta nativa. De um lado, o Incra de Rondônia estimula famílias à espera da regularização de títulos de terra, de outro, busca desestimular acampamentos acusados por derrubadas semelhantes a clareiras, e não mais que isso.

Colonos migrantes sobem o morro em Colorado do Oeste, no final da década de 1970, tempo em
que foram obrigados a derrubar a metade do lote de cem hectares (Foto Marcos Santilli)


A Superintendência Regional do Incra anunciou no último dia 11 que a medida irá contemplar agricultores familiares de pequenos imóveis rurais de Buritis, Candeias do Jamari, Cujubim, Machadinho do Oeste, Nova Mamoré e Porto Velho. “A iniciativa se destina a agricultores familiares de pequenos imóveis rurais, que receberão pagamento por conservarem áreas com mata nativa, por fases”, diz a informação divulgada pelo Instituto. No interior de Buritis, Nova Mamoré e Porto Velho ocorrem graves conflitos fundiários pela posse da terra.  

“A centralidade dos conflitos nos parece estar no direito à terra e ao território como direito humano, o que significa que a terra assume múltiplas dimensões sociais, debate já reconhecido pela literatura especializada, alargando o sentido social da terra e do território para com o universo do campesinato, povos e comunidades tradicionais”, diz o professor pesquisador da Universidade Federal de Rondônia (Unir), Afonso Maria Chagas, no estudo denominado  Direitos territoriais: identidades, pertencimentos e reconhecimento. Ele é mestre em Direito Público e doutor em Ciência Política.

Pressão da soja e do boi

Ao analisar a formação socioespacial de Rondônia, que deu prioridade à política de colonização agrícola, Chagas afirma que ela resultou numa “estrutura fundiária com forte presença das pequenas propriedades e com a agropecuária vinculada aos mercados regional e nacional.”

Contudo, observa o pesquisador, “de duas décadas para cá, a pequena propriedade encontra-se pressionada pelo agronegócio da soja e da pecuária de corte, cujos conflitos agrários ampliam a escala da problemática social, e nesse contexto a luta pela terra vincula-se à luta pelo território.”

A equipe do Projeto Floresta+ Amazônia* apresentou ao Incra, na semana passada, a Chamada Pública nº 02/2024 que estabelece as regras de participação: a Fase 1 é dividida em duas parcelas de R$ 1.500, exclusivamente a quem exerce suas atividades nos municípios prioritários. O recebimento do valor ocorrerá no primeiro ano de adesão; a segunda parcela, após o agricultor conseguir a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e apresentar o Cadastro da Agricultura Familiar (CAF).

Na Fase 2, agricultores familiares de pequenos imóveis rurais de toda a Amazônia Legal deverão apresentar a validade de seus imóveis rurais pela Secretaria Estadual do Desenvolvimento Ambiental (Sedam), órgão responsável pela expedição do CAR.

“Para aderir a essa fase, os imóveis rurais devem estar com o CAR já validado. Os pagamentos variam de acordo com a quantidade de vegetação nativa que cobre o imóvel, começando em R$ 200 por hectare para quem tem até 80% de vegetação nativa e passando para R$ 800 por hectare para quem tem mais de 80%”, estabelece o programa.

Conforme explicou a engenheira florestal Naelha Sarmento, não há necessidade de o agricultor passar pela Fase 1 para acessar a fase 2: “Ambas são independentes.”

Prazo: 30 de junho

A inscrição do agricultor familiar a esse incentivo será gratuita, até o próximo dia 30 de junho, no site do Projeto Floresta+ Amazônia ou na página do MMA. Os interessados ainda poderão contar com apoio para fazer sua inscrição durante os mutirões realizados em Rondônia com o apoio do Incra.

O superintendente regional, Luís Flávio Carvalho Ribeiro, disse que essa medida se soma “ao conjunto de ações implementadas para o desenvolvimento das famílias agricultoras.”

Pequenos produtores acreanos também recebem incentivo financeiro para fomento e restauração de áreas degradadas (Foto: Assessoria de Comunicação do INCRA)


Já no Acre, o Incra liberou R$ 9 milhões para fomentar a produção de 858 famílias em 36 assentamentos, distribuídos por 11 municípios. Os recursos são destinados às modalidades Apoio Inicial, Fomento, Fomento Mulher e Recuperação Ambiental do Crédito Instalação.

“Os valores serão investidos pelos beneficiários da reforma agrária na aquisição de bens e serviços para desenvolvimento de atividades produtivas e ainda na restauração de áreas degradadas ou implantação de sistemas sustentáveis nos lotes, no caso da modalidade ambiental”, informa a assessoria do Instituto.

Segundo o Incra no Acre, novos contratos serão brevemente assinados. Estima-se a liberação de mais R$ 20 milhões, ainda este ano, beneficiando duas mil novas famílias com créditos para investimento produtivo, além da construção de trezentas moradias para assentados.
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* O Projeto Floresta+ Amazônia é uma iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), com o apoio do Fundo Verde para o Clima (GCF).

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