dos varadouros de Rio Branco
As lideranças dos povos indígenas cujos territórios estão localizados na zona da fronteira Brasil-Peru, divulgaram esta semana uma carta com denúncias sobre ameaças a que suas comunidades estão submetidas. A atuação de organizações criminosas ligadas ao narcotráfico, a exploração madeireira e projetos para a abertura de estradas são apontadas como as principais pressões para os indígenas dos dois lados fronteiriços. A carta vem uma semana após a realização da 5o Reunião da Comissão Transfronteiriça Yurúa – Juruá – Alto Tamaya.
“Durante os três anos de trabalho conjunto da Comissão Transfronteiriça Juruá – Yurúa – Alto Tamaya, temos identificado um aumento exponencial das atividades ilegais na região de fronteira, do descumprimento das leis por parte de empresas e instituições governamentais locais e da negligência dos estados diante deste cenário”, diz trecho do documento.
Entre os impactos ocasionados pelo tráfico internacional de drogas estão a cooptação de jovens indígenas para atuarem como “soldados” das facções criminosas, e a abertura de pistas de pouso no meio da floresta para o transporte da cocaína produzida no lado peruano.
Outro problema denunciado, e que também ocorre na Amazônia peruana, é o anúncio, pelo governo regional de Ucayali, da abertura de uma rodovia interligando os vilarejos de Nueva Itália e Puerto Breu. Segundo os indígenas, a construção da estrada acontece “sem consulta prévia, livre e informada aos povos da região e também sem estudos técnicos de viabilidade e de impacto socioambiental”.
A abertura da estrada é vista com preocupação tanto pelos indígenas do Peru quanto do Brasil, por ser mais um caminho para a atuação do narcotráfico e da indústria madeireira. Por estar muito próxima da zona fronteiriça, as lideranças acreanas temem invasões aos seus territórios por madeireiros.
A carta conjunta ainda denuncia uma completa ausência de política de fiscalização e controle da fronteira Brasil-Peru pelos governos dos dois países. “Denunciamos e solicitamos às instituições competentes, tanto do estado brasileiro quanto do estado peruano, uma ação imediata para conter e combater as ameaças identificadas pela nossa comissão.”
Leia abaixo a íntegra da carta:
CARTA DENÚNCIA
5a Reunião da Comissão Transfronteiriça Yurúa – Juruá – Alto Tamaya
Os povos indígenas, organizações indígenas e demais instituições, reunidas na 5a Reunião da Comissão Transfronteiriça Yurúa – Juruá – Alto Tamaya, realizada no período de 28 a 30 de outubro de 2023, em Marechal Thaumaturgo, Acre/BR, vem por meio desta carta denunciar as ameaças e falta de atenção dos estados do Brasil e Peru para região.
Durante os três anos de trabalho conjunto da Comissão Transfronteiriça Juruá – Yurúa – Alto Tamaya, temos identificado um aumento exponencial das atividades ilegais na região de fronteira, do descumprimento das leis por parte de empresas e instituições governamentais locais e da negligência dos estados diante deste cenário.
Dentre as principais ameaças que os povos indígenas e o meio ambiente vêm sofrendo nessa região transfronteiriça estão:
* Avanço do crime organizado (narcotráfico, exploração ilegal de madeira, invasão de territórios indígenas, tráfico de terras entre outros), com cooptação de jovens indígenas, construção de inúmeras pistas de pouso e abertura rotas ilegais na faixa de fronteira.
* Aumento substancial das ameaças de morte aos líderes indígenas e defensores ambientais que atuam na região.
* Declaração oficial do governo de Ucayali divulgando a consolidação da construção da estrada Nueva Itália – Puerto Breu sem consulta previa, livre e informada aos povos da região e também sem estudos técnicos de viabilidade e de impacto socioambiental do empreendimento.
* Existência de inúmeras concessões florestais (em exploração ou não) em sobreposição as áreas de uso de comunidades nativas da região, inclusive afetando a biodiversidade e as nascentes dos rios fundamentais para manutenção do equilíbrio dos ecossistemas e sobrevivência dos povos indígenas no Brasil e no Peru.
* Ausência de monitoramento, fiscalização e controle do estado do Peru e do Brasil sobre as atividades ilegais que afetam o meio ambiente e os povos indígenas da região. Ausência de ações concretas e atenção por parte dos órgãos de ambos os países para criação de alternativas sustentáveis para os povos da região
Estamos cientes que vai acontecer em Pucallpa em 2024 a reunião do Grupo dos Governadores pelo Clima e da Floresta, que inclui os governos do Acre e de Ucayali que declaram estar comprometidos com a proteção da floresta e com o equilíbrio climático. Queremos saber as reais intenções dos estados para além da divulgação de sua imagem no âmbito internacional e suas visões sobre as ameaças expostas acima.
Denunciamos e solicitamos às instituições competentes, tanto do estado brasileiro quanto do estado peruano, uma ação imediata para conter e combater as ameaças identificadas pela nossa comissão.
Solicitamos também o agendamento de uma reunião com os ministérios das relações exteriores de ambos os países com presença de representantes desta Comissão Transfronteiriça para que os estados possam coordenar um plano de ação binacional de combate às pressões e ameaças, pois sabemos que realizar ações somente de um dos lados da fronteira significa gerar um agravamento das atividades ilegais do outro lado da fronteira.’
Enviamos em anexo o Diagnósticos Transfronteiriço divulgado pela Comissão no ano de 2022 para maior entendimento do contexto.
Estamos abertos para dialogar e para esclarecer dúvidas.
Assinam esta carta os representantes das organizações indígenas, comunidades nativas e territorios indígenas, abaixo:
Asociación de Comunidades Nativas para el Desarrollo Integral de Yurúa Yono Sharakoiai –
ACONADIYSH
Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá – OPIRJ
Associação Ashaninka do Rio Amônia – APIWTXA
Instituto Yorenka Tasorentsi
Asociación Ambiental de la Comunidad Ashéninka Pocharipankoky Pikiyako Yurúa – AACAPPY
Organización de los Pueblos Asháninka y Ashéninka del Distrito de Iparía – ORPADI
UNIVAJA
Associação do Povo Indígena Jaminawa Arara do Rio Bagé – AJARB
Terra Indígena (TI) Apolima-Arara
TI Jaminawa do Bajé
TI Arara do Cruzeiro do Vale
TI Kaxinawá do Breu
TI Nukini
TI Katukina
TI Kuntanawa
TI Nawa
TI Jaminawa do Igarapé Preto
TI Yawanawá do Rio Gregrório
Comunidad Nativa (CN) Sawawo Hito 40
CN Alto Tamaya Saweto
CN Dulce Gloria
CN Nueva Victoria
CN El Dorado
CN Onconashary
CN Paititi
CN Santa Rosa
CN Koshireni del Rio Breu
Associacao dos Guerreiros Guardioes da Floresta