Ouro da morte: organizações preparam novas ações contra o garimpo

Compartilhe

Áreas de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami vistas em sobrevoo ao longo do rio Mucajaí. (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)



Dos varadouros de Porto Velho

A extração do ouro na Amazônia continua dizimando os povos indígenas e matando espécies vivas que habitam florestas do Brasil. No território Yanomami, criado há 32 anos em Roraima, estão as maiores vítimas. O Ministério da Saúde registrou 308 mortes de pessoas na Terra Indígena Yanomami em 11 meses de 2023 e mais da metade (162) eram crianças de 0 a 4 anos. Um cenário de mortalidade infantil comparável à dos países com os piores índices do mundo. Sem atuação com políticas públicas eficientes na região no último ano, houve aumento dos casos de malária, gripe e doenças diarreicas com mortes.

A retirada de ouro com mercúrio contamina água, elimina peixes, deixa solo improdutivo e muda o ciclo de vida do bioma. O Ministério Público Federal (MPF) faz esforços em conjunto com o poder público para tentar frear a extinção dos povos e do modo tradicional de vida na mata. Em Manaus, o MPF reuniu representantes do Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia e Marinha do Brasil.

O Ministério Público recomendou a destruição in loco de dragas e balsas utilizadas para a extração ilegal de minério. Essas balsas geram a descapitalização da atividade ilegal, evita a continuidade de danos ambientais e produz um efeito pedagógico de desestímulo para a realização de novas atividades ilícitas. Cada draga custa aproximadamente R$ 1 milhão. Outro assunto abordado foi o planejamento e os métodos utilizados para inutilização e destruição de instrumentos utilizados no garimpo, em especial de dragas fluviais, cuja descoberta e acesso exigem alto custo logístico e operacional. Roraima possui 922 quilômetros de l fronteira com países sul-americanos, sendo a Venezuela ao norte e noroeste e a Guiana a leste.

Os representantes dos órgãos presentes na reunião compartilharam dificuldades técnicas e operacionais rotineiras associadas a este tipo de atividade. As entidades se comprometeram a analisar a possibilidade de aprimoramento da estrutura de pessoal e da infraestrutura técnica de combate ao garimpo ilegal, promover a interlocução com outros entes federativos, implementar medidas de fiscalização das embarcações utilizadas no garimpo do ouro, bem como estudar meios para aprimorar os métodos utilizados para a destruição e a inutilização das dragas apreendidas em operações de fiscalização.

Enquanto isso, o MPF, Ibama, Exército e outras instituições de fiscalização continuam na tentativa de coibir o garimpo ilegal na região amazônica. Em uma única operação, realizada em 2019, foram destruídas mais de 50 balsas de garimpo ilegal que operavam nos rios Jutaí, Curuena e Mutum, no município de Jutaí (a 751 quilômetros de Manaus). No mesmo ano, o MPF recomendou ação semelhante para combate crimes ambientais nas imediações do Rio Japurá.

Os representantes dos órgãos presentes na reunião se comprometeram em promover encontros periódicos, a fim de coordenar iniciativas e unificar práticas de prevenção e combate ao garimpo ilegal.

O MPF realiza o acompanhamento dos casos por meio de procedimentos internos, inquéritos e ações civis públicas. O órgão ministerial criou, em 2022, 30 ofícios especiais para acompanhamento da questão socioambiental na Amazônia, dez deles com atribuição exclusiva.

CRISE SEM FIM – A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, declarou que a crise humanitária que se abateu sobre a Terra Indígena Yanomami, na Região Norte do país, não será resolvida tão cedo, apesar dos esforços do governo federal.

“Assim como foram décadas de invasão para chegar a este ponto, pode levar décadas para restabelecer tudo. Ah!, Em um ano vai resolver [os problemas]. Não resolvemos e, possivelmente, não se resolverá em toda a sua dimensão em 2024”, acrescentou a ministra, alegando que não basta retirar os não-indígenas das terras que a União destinou ao usufruto exclusivo dos yanomami e distribuir cestas básicas para restabelecer as condições de saúde das comunidades locais.

De acordo com Guajajara, levará anos para que o território se regenere da destruição causada pelo garimpo ilegal. “Para os yanomami terem seu modo de vida de volta é preciso retirar os invasores [da área]. É preciso que [os indígenas] tenham como plantar; que os rios sejam despoluídos para que [as comunidades] tenham água para beber […] Ou seja, para sarar as pessoas, é preciso primeiro sarar a terra. Para isso, é preciso desocupar o território”, argumentou a ministra.

No dia 20 de janeiro, completa um ano que o Ministério da Saúde decretou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional. O objetivo da medida é restabelecer os serviços de saúde e socorrer parte dos cerca de 30,4 mil yanomami que vivem espalhados pela maior terra indígena do Brasil. Com cerca de 9,6 milhões de hectares, a reserva abrange parte do território de Roraima e do Amazonas, próximo à fronteira com a Venezuela. Cada hectare corresponde, aproximadamente, às medidas de um campo de futebol oficial.

O governo federal também instituiu um Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária; suspendeu a entrada de não-indígenas na reserva yanomami e determinou que a Força Aérea Brasileira (FAB) intensificasse o controle aéreo na região, limitando a área de voos. Simultaneamente, órgãos ambientais e forças de segurança federais deflagraram ações conjuntas de combate ao garimpo e à extração de madeira.

As medidas implementadas forçaram cerca de 80% dos garimpeiros ilegais a deixarem a região, mas os problemas não cessaram. “Quem ficou dentro do território yanomami são as organizações criminosas; o crime organizado, que continua ameaçando e violentando meninas [indígenas]”, afirmou a ministra, que defende uma presença maior das Forças Armadas na região.

Segundo a ministra, entre as ações federais, o governo realizou mais de 140 testes de malária e notificaram 26.466 mil casos positivos que cresceram 75%. Algumas dessas comunidades estão sem receber apoio médico há mais de quatro anos. Todos os casos receberam medicação e acompanhamento profissional.

AÇÕES – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou investimentos de R$ 1,2 bilhão em ações estruturantes no território Yanomami.

De imediato haverá instalação da chamada Casa de Governo, que funcionará em Boa Vista (RR) equipes de vários órgãos federais, como os ministérios dos Povos Indígenas, do Meio Ambiente, dos Direitos Humanos, da Educação e da Saúde, além da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), entre outros.

No último ano, o número de profissionais de saúde atuando no território yanomami passou de 690 para 960. O governo federal pretende inaugurar, ainda este ano, 22 novas unidades de saúde que serão construídas em comunidades “grandes” da Terra Indígena Yanomami que ainda não possuem unidade básica de saúde.

Logomarca

Deixe seu comentário

VEJA MAIS

banner-728x90-anuncie