Em crise social e ambiental, Rondônia ostenta dinheiro público com decoração natalina
Em uma década, o estado foi severamente impactado por eventos climáticos extremos, que deixam a população urbana e rural em insegurança hídrica. No período seco, a fumaça das queimadas levou milhares aos hospitais por problemas respiratórios. Para mascarar problemas, a Assembleia de Rondônia gastou R$ 3 milhões com a decoração para o Natal.
dos varadouros de Porto Velho
Rondônia enfrentou em 2024 a pior crise ambiental de todos os tempos, nunca antes ocorrida. A fumaça das queimadas provocada pela ação criminosa cobriu cidades, adoeceu pessoas e superlotou hospitais. O Rio Madeira ficou sem água, peixes e vida. Centenas de ribeirinhos e comunidades tradicionais ficaram sem esperança. A justiça rondoniense moveu várias ações judiciais contra os governos federal, municipal e estadual alegando ausência de políticas públicas de mitigação e adaptação climática.
O governo do Coronel Marcos Rocha (União) não tinha estrutura, brigadistas e aeronaves para combater incêndios na floresta. Além disso, demorou para agir. E Rocha chegou a dizer: “A floresta é úmida e não pega fogo”, discurso comum entre os conservadores e antiambientalistas da extrema-direita.
A população nem se recuperou da crise ambiental e o dinheiro que poderia ter ajudado muita gente naquele momento, foi exposto de maneira luxuosa para ornamentar o prédio da Assembleia Legislativa. A decoração natalina do Poder Legislativo, onde mais de 90% dos parlamentares são defensores do agronegócio custou aos cofres públicos cerca de R$ 3 milhões.
Um custo elevado para um estado marcado por graves problemas sociais e econômicos. O estado lidera os índices de feminicídio no Brasil, com uma taxa de 2,8 casos para cada 100 mil mulheres, o que é mais do que o dobro da média nacional. Além disso, enfrenta altas taxas de desemprego e exclusão social, enquanto quase metade da população vive em situação de pobreza, segundo dados do IBGE.
A precariedade na saúde pública agrava o quadro. Porto Velho, a capital, não possui hospital público municipal, e o Hospital João Paulo II, administrado pelo estado, é reconhecido como o pior do Brasil devido à falta de estrutura e superlotação. Pacientes frequentemente enfrentam condições indignas, como falta de macas e longas filas de espera para atendimento básico.
Com os R$ 3 milhões gastos na iluminação natalina seria possível construir cerca de 30 unidades habitacionais de interesse social, considerando o custo médio de R$ 100 mil por residência. Esse valor também poderia ser direcionado à aquisição de equipamentos médicos essenciais para hospitais ou ao fortalecimento de políticas de combate à violência contra a mulher, como a ampliação de delegacias especializadas e casas de acolhimento.
Os deputados também aprovaram um abono natalino para todos os servidores efetivos, comissionados, ativos e inativos neste fim de ano que totaliza R$ 5 mil para cada trabalhador. Na soma geral são mais de R$ 10 milhões acrescidos na folha de pagamento só de dezembro.
Porto Velho distribui até 1 milhão de litros em caminhões-pipa e segue perfurando poços
Onde investir
Com esse valor é possível construir até cinco Unidades Básicas de Saúde (UBS), ao custo médio de R$ 2 milhões cada. Cada UBS pode atender cerca de 20 mil pessoas anualmente, garantindo acesso a serviços médicos essenciais. Adicionalmente, com um investimento de R$ 2 milhões, seria possível equipar hospitais existentes com tomógrafos e incubadoras, modernizando o atendimento e reduzindo filas para exames.
Na educação, cerca de R$ 5 milhões poderiam ser direcionados para a reforma e modernização de até 10 escolas públicas, com um custo médio de R$ 500 mil por unidade, impactando positivamente milhares de estudantes. Outra parte desse valor, como R$ 1 milhão, poderia financiar a capacitação de professores, melhorando a qualidade do ensino e a formação educacional.
No setor habitacional, seria possível construir cerca de 150 casas populares, considerando o custo médio de R$ 70 mil por unidade. Isso atenderia diretamente famílias em situação de vulnerabilidade, garantindo moradia digna e reduzindo o déficit habitacional. Ainda em segurança, com R$ 2 milhões seria possível modernizar as forças policiais por meio da aquisição de viaturas, drones e sistemas de monitoramento, fortalecendo as ações de combate ao crime e aumentando a segurança da população.
Em relação ao meio ambiente, R$ 1 milhão poderia ser usado em tecnologia de monitoramento e fiscalização, como drones, para proteger áreas de conservação e reduzir o desmatamento ilegal. Outros R$ 500 mil poderiam ser investidos em projetos de reflorestamento, recuperando até 100 hectares de áreas degradadas. Por fim, na área de segurança alimentar, com R$ 2 milhões seria possível criar dois centros de distribuição de alimentos, cada um atendendo cerca de 10 mil pessoas em situação de vulnerabilidade.
A escolha por gastos ostensivos em festividades contrasta com as necessidades urgentes da população, suscitando críticas sobre a prioridade dada às demandas sociais. A população questiona: até que ponto essas escolhas representam a vontade e o bem-estar coletivo? Investir em infraestrutura básica e proteção social poderia gerar impactos mais significativos para os rondonienses que enfrentam diariamente os desafios de uma realidade marcada por desigualdades e abandono.
Caos ambiental
Os rondonienses enfrentam uma grave situação ambiental, destacando-se no cenário nacional pelos impactos sobre a Amazônia. Embora o estado tenha obtido avanços recentes, como uma redução de 62,5% no desmatamento entre agosto de 2023 e julho de 2024, em comparação ao período anterior, os desafios permanecem imensos. Essa conquista foi alcançada através de estratégias como monitoramento por satélite e operações de fiscalização intensivas do governo federal. Mesmo assim, registrou cerca de 25 mil alertas de desmatamento no mesmo período, segundo o Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (DETER) do INPE
Tem ainda as pressões por ocupação irregular, mineração ilegal e exploração de madeira persistem. Operações de combate a crimes ambientais, precisam de mais investimentos contínuos para garantir efetividade a longo prazo. Além disso, a crise de fiscalização gerada por restrições orçamentárias e condições precárias de trabalho dos servidores da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam), Ibama e ICMBio agrava a situação.
Em 2023, Rondônia foi o segundo estado com maior redução de degradação florestal, mas os números ainda revelam uma realidade preocupante, especialmente considerando os impactos climáticos e sociais associados à destruição da floresta. O desmatamento está diretamente ligado a questões como perda de biodiversidade e aumento das emissões de carbono, o que compromete tanto o equilíbrio ecológico quanto às condições de vida da população.