LIBERDADE DE EXPRESSÃO

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Varadouro passa a integrar Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores


Adesão do Varadouro é uma das estratégias adotadas pelo veículo para assegurar a integridade física e psicológica de seus profissionais numa das regiões mais violentas do país. Consolidação de uma extrema-direita antidemocrática também é outro desafio para a liberdade de imprensa no Norte do país



Varadouro

OS ATAQUES contra pessoas que atuam nos mais diversos setores na área de comunicação no Brasil, durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), duraram até o último dia de seu governo, no fim de 2022. O novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), trouxe o país de volta a um clima de estabilidade institucional, mas a violência estrutural contra os jornalistas, em um cenário midiático marcado por uma forte concentração no setor privado e os efeitos da desinformação, continuam a representar desafios para a liberdade de imprensa no país. Diante deste cenário da necessidade de defesa da comunicação Varadouro passou a integrar a Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, coordenada pelo Instituto Vladimir Herzog, Artigo 19, Repórteres Sem Fronteiras, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e Associação Profissão Jornalista (APJor).

A Rede de Proteção é fruto de uma articulação entre organizações da sociedade civil com jornalistas e comunicadores de todo o Brasil. A iniciativa pretende combater o avanço dos ataques e das ameaças à liberdade de expressão, por meio da denúncia de casos, de processos de formação e de estratégias para garantir a participação de diferentes atores que podem e devem contribuir com a segurança dos profissionais da imprensa, que exercem um papel crucial para o bom funcionamento do regime democrático.

O projeto iniciou em 2018, a partir de dois encontros realizados em São Paulo, que reuniu jornalistas, comunicadores e representantes de organizações da sociedade civil, de coletivos de mídia e de outras iniciativas de defesa dos direitos humanos. Desde que foi criada a Rede já atendeu 106 casos relacionados à ameaças verbais, ataques digitais, censura e assédio judicial.

“Fazer jornalismo na Amazônia é sempre desafiador. E integrar a Rede de Proteção, um movimento com articulação em todas as regiões do território brasileiro é muito importante para o exercício pleno das equipes de jornalistas do Varadouro. Quando somos vítimas de ataques, ameaças, intimidações e processos judiciais, a gente se sente sozinho. E a Rede nos traz essa sensação prática de solidariedade a partir de suas diversas iniciativas e estratégias”, diz Fábio Pontes, editor-executivo do Varadouro, que participou nas últimas semanas dos diálogos com a secretaria executiva da Rede para integrar o movimento.

De acordo com informações da organização internacional que defende a liberdade de expressão, Repórteres Sem Fronteiras (RSF), na última década, pelo menos 30 jornalistas foram assassinados no Brasil, o segundo país mais perigoso da região para os profissionais da imprensa. Blogueiros, radialistas e jornalistas independentes que trabalham em municípios de pequeno e médio porte cobrindo corrupção e política local são os mais vulneráveis. O assédio e a violência online contra jornalistas, especialmente mulheres, continuam a crescer. Em 2022, pelo menos três assassinatos tiveram relação direta com a prática do jornalismo, incluindo o do jornalista britânico Dom Phillips, morto no interior do Amazonas.

O resultado do segundo turno das eleições de 2022 foi devastador para jornalistas e veículos de comunicação que se posicionaram de maneira crítica às medidas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), aos movimentos antidemocráticos que pediam o retorno da ditadura militar, impeachment dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e até fechamento de emissoras de TV. Na região Norte, Rondônia foi um dos estados do Norte que registraram o maior crescimento de ataques contra jornalistas e comunicadores, onde houve casos de incêndios com destruição total de emissora de rádio, tiros disparados contra casa e carro de jornalista, redações foram alvo de balas, e os processos judiciais aumentaram contra pessoas que atuam na comunicação.

ENCONTRO NACIONAL

Varadouro esteve representado pelo jornalista Francisco Costa no 3º Encontro da Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, que aconteceu entre os dias 27 e 28 de julho, em Brasília. No primeiro dia do encontro foi apresentada uma prévia sobre um levantamento que está traçando o perfil dos mais de 100 integrantes que hoje compõem a Rede. Os dados evidenciam a ampliação das atividades da articulação no último período e demonstram desafios relacionados ao aumento da diversidade entre o grupo.

“Foi um encontro excelente do ponto de vista de amadurecimento da Rede de Proteção, onde planejamos os próximos anos de atuação, elaboramos uma Carta de Princípios, um estatuto e conseguimos compartilhar experiências com pessoas de todo o Brasil. Acho que o ponto alto do evento foi a presença de representação do governo federal, onde falaram da preocupação com a proteção de comunicadores e das políticas públicas que vão ser executadas pelo Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas e a Secretaria Nacional de Justiça. E o Varadouro ter inserção e incidência nesse projeto é uma grande conquista”, afirma Costa, articulador na região Norte da Rede de Proteção e repórter especial do Varadouro em Porto Velho.

O Encontro teve um momento dedicado ao debate sobre o Estatuto da Rede, que revisitou algumas diretrizes de atuação, sendo: 1) Objetivos gerais; 2) Valores; 3) Desenho institucional e composição; e 4) Estratégias de atuação. Além dos ajustes sugeridos pelo grupo para tornar o documento mais inclusivo e plural, foram sugeridas descrições dos tipos de apoio oferecidos pela Rede Nacional de Proteção e sobre como uma pessoa ou organização pode tornar-se integrante.

Na sequência houve um debate sobre conjuntura, no qual foram relatadas experiências de pessoas jornalistas e comunicadoras em diversos territórios de atuação. Desafios relacionados à superação de intimidação e censura foram destacados nas falas e o assédio judicial, não só por veiculação de matérias, mas por postagens em redes sociais, foi um dos focos do debate, dado o aumento deste tipo de violência contra pessoas jornalistas e comunicadoras nos últimos anos. A possibilidade de levar ocorrências de ameaças e ataques à Justiça Federal foi debatida, entendendo que poderia haver maior efetividade no combate dos casos.

A Rede encerrou o dia recebendo integrantes da atual gestão do governo federal para dialogar sobre a liberdade de atuação de pessoas jornalistas e comunicadoras no Brasil. Estiveram presentes Lazara Carvalho, chefe de gabinete da Secretaria Nacional de Justiça, órgão responsável pelo Observatório Nacional de Violência contra Jornalistas e Comunicadores; e Claudia Almeida Soares, representante do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, iniciativa vinculada ao Ministério de Direitos Humanos.

No segundo dia de Encontro, participantes se dividiram em Grupos de Trabalho (GTs) para debater, com mais profundidade, os eixos de atuação da Rede e definição de diretrizes para os próximos anos. Os GTs tiveram como temas: pesquisa e inovação; formação; articulação e incidência; e proteção, além de um GT dedicado à redação de uma carta de princípios da Rede. No final dos debates, relatores (as) apresentaram as sistematizações.

Após discussão sobre as diretrizes, a carta de princípios foi lida e comentada pelos participantes. A partir do documento ficou firmado que a Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores está baseada na defesa coletiva, irrestrita e inegociável de cinco pilares: 1) Defesa ao direito à comunicação; 2) Defesa dos Direitos Humanos e da Terra; 3) Solidariedade e Acolhimento; 4) Compromisso com respeito à diversidade; e 5) Defesa da democracia.

O encontro foi encerrado com um momento cultural que contou com leitura de poemas, apresentação e venda de livros e compartilhamento de vivências propiciadas pela atuação em jornalismo e comunicação.


Leia a íntegra da carta elaborada durante o 3º Encontro da Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores



CARTA DE PRINCÍPIOS


A Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, fruto de uma articulação entre organizações da sociedade civil de todo o Brasil, defende o direito à comunicação, atuando para assegurar a liberdade de imprensa e garantir a proteção de pessoas jornalistas e comunicadoras. A Rede está baseada na defesa coletiva, irrestrita e inegociável dos cinco pilares abaixo.

  1. Defesa ao direito à comunicação: Defendemos a comunicação como direito humano nas suas mais diferentes formas, liberdade de expressão, liberdade de imprensa e direito à informação, como pilar da democracia. Ao mesmo tempo que primamos pela produção ética de conteúdo.
  2. Defesa dos Direitos Humanos e da Terra: Reconhecemos os direitos humanos como fundamentais nos aspectos civis e políticos, assim como os direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. Defendemos os direitos difusos e coletivos dos povos originários, tradicionais, tanto em ambientes urbanos, periféricos quanto no campo.
  3. Solidariedade e Acolhimento: Compreendemos a importância de identificar e acolher pessoas jornalistas e comunicadoras que enfrentam ameaças, perseguições e violações de seus direitos no exercício de sua atividade. Apoiamos aquelas que se encontram em situações vulneráveis, para garantir que continuem exercendo o seu direito à comunicação.
  4. Compromisso com respeito à diversidade: Valorizamos a diversidade e combatemos todas as manifestações de preconceito e discriminação. Repudiamos o capacitismo e incentivamos a equidade de gênero, raça e etnia. Defendemos a justiça reprodutiva e o respeito à diversidade territorial e cultural. Combatemos todas as expressões do racismo, machismo e LGBTfobia.
  5. Defesa da democracia: Reivindicamos a democracia como um valor fundamental. Defendemos a liberdade religiosa e a laicidade do Estado. Acreditamos na importância da justiça socioambiental. Combatemos a xenofobia, promovendo a integração das pessoas, independentemente de sua origem ou nacionalidade.


Ao aderir a esta carta de princípios, comprometemo-nos a atuar de forma coesa e responsável com os valores aqui estabelecidos.

Brasília – DF

Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores


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