Huni Kuin do rio Humaitá avistam “parentes brabos”, que deixaram cesta com milho como sinal de intercâmbio
Varadouro
UM VÍDEO que circula em grupos de WhatsApp desde o último fim de semana mostra o que seria uma tentativa de contato entre indígenas isolados e o povo Huni Kuin, da aldeia São Vicente, do alto rio Humaitá, no município de Feijó. Nele, um dos moradores mostra a cesta com um tipo de milho não cultivado nos roçados Huni Kuin da região. Para especialistas ouvidos por Varadouro, ao deixarem a cesta com os milhos, os indígenas isolados tentaram fazer uma troca. Eles estariam em busca de ferramentas como terçados e panelas, além de roupas. Os relatos são os de que os Huni Kuin teriam avistado o grupo de isolados na localidade chamada Três Cantos.
Localizada na região de fronteira com o Peru, a Terra Indígena Kaxinawa do Rio Humaitá é uma das terras indígenas do Acre com as maiores presenças de grupos isolados. É comum nesta época do verão amazônico eles saírem das cabeceiras e descerem os rios, fazendo “contato” com os parentes aldeados. Este movimento acontece em busca de caças e pesca às margens dos rios. Ao se aproximarem das aldeias, e muitas vezes permitindo serem avistados, eles também buscam utensílios que podem ser úteis para o cultivo dos roçados. Além do milho, a banana e a macaxeira estão entre os principais alimentos destes grupos.
Com a perspectiva de um verão bastante severo para a Amazônia em 2023, há a perspectiva de uma intensificação destes contatos e avistamentos. A situação é preocupante diante da possibilidade dos isolados acabarem contraindo doenças ao levarem panelas, ferramentas agrícolas e roupas. De acordo com relatos vindos da região do Humaitá, nos últimos dias houve o caso de uma tentativa dos isolados levarem roupas de uma casa da aldeia São Vicente.
“Para os Huni Kuin do Humaitá, isso foi um tipo de intercâmbio, e que os mais velhos falaram que esse tipo de milho não existe na região do Humaitá. Historicamente, os ‘parentes brabos’ que habitam as cabeceiras do rio Humaitá vêm adquirindo ferramentas de metal (machados, terçados, facões) obtidas ao longo dos anos para realizarem a limpeza de seus roçados e a construção de malocas (kupixawa).”, explica o indigenista José Frank, assessor técnico do Setor de Geoprocessamento da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre). A entidade mantém contatos constantes com os Huni Kuin do rio Humaitá.
Uma das preocupações da entidade é justamente com a proteção aos grupos isolados. A orientação repassada é para se evitar, ao máximo, o contato com os “parentes brabos”, expressão como os Huni Kuin se referem aos vizinhos em isolamento voluntário. No alto rio Humaitá, eles conservam uma casa de monitoramento onde deixam os utensílios mais buscados pelos isolados, como as panelas e terçados. Dessa forma evita-se a aproximação deles das aldeias mais habitadas.
Como não se sabe como seria a reação de um contato, o distanciamento ainda é a medida mais segura para a relação com os “parentes brabos”, além de se evitar o risco de contágio por doenças. Como os isolados apresentam uma baixa imunidade às doenças típicas do “mundo civilizado”, uma simples gripe pode se tornar trágica para estes grupos.
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