
Em artigo escrito para Varadouro, o ex-governador do Acre Tião Viana (PT) e o jornalista e publicitário Gilberto Braga fazem uma análise sobre o papel e a importância histórica do Papa Francisco para a Amazônia. O pontífice, sem sombra de dúvidas, teve papel essencial para a Floresta Amazônica ocupar o centro das discussões sobre as mudanças climáticas que afetam todo o mundo. Em 2018, lembram os autores, Francisco foi agraciado pelo Acre com o Prêmio Chico Mendes de Florestania, como reconhecimento por sua luta em defesa da Amazônia e das populações que nela vivem.
Leia o artigo.
Francisco da Amazônia, rogai por nós
Tião Viana e Gilberto Braga de Mello
Francisco abençoou os povos indígenas em Puerto Maldonado e assim ficou para sempre perto de todos nós, mulheres e homens de todas as origens que vivemos a Amazônia. Naquela sexta-feira, 19 de janeiro de 2018, essa fronteira consagrada à Madre de Dios, mas arrebatada pela violência contra a sua gente e a sua natureza, enfim testemunhava o Papa humilde ouvir o clamor dos povos originários para depois, em nome de Deus, pedir a reversão da exploração histórica de estados e empresas que tratam a Amazônia como uma despensa de recursos naturais, sem respeitar os seus habitantes nem a importância das florestas para a vida na Terra.
Ali em Puerto Maldonado, tão próximo do nosso Acre, Francisco lançou as bases de uma nova benção – ou fundamento histórico – da Igreja Católica, que se afirma no Sínodo da Amazônia, realizado em Roma, em outubro do ano de 2019. Esse ato sinodal diferente e único, é impactante desde o seu tema: – Amazônia: Novos caminhos para a Igreja e para uma Ecologia Integral. É um chamado corajoso para olhar a Amazônia de um jeito novo, consagrar seu esplendor e seus mistérios, sentir suas dores e encarar seus desafios juntos e misturados no abismo profundo da tragédia ecológica fabricada pela ganância humana e suas intersubjetividades.
O Sínodo da Amazônia teve formato e ritual diferenciados dos demais para incluir indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outros representantes da nossa população multicultural, nos colocando ao lado de bispos, padres, freiras e membros de congregações, inclusive nos grupos de trabalho para redação do documento sinodal. “Querida Amazônia”, assim o texto se inicia para orientar que, além do entendimento do Sínodo, se deve reverenciar a floresta e as pessoas que vivem aqui, pois estas, mais que o próprio Papa e a Cúria Romana, “melhor conhecem, pois lá vivem, sofrem e amam apaixonadamente a Amazônia”.
Ao abraçar a nós, viventes da Amazônia, o Papa Francisco, mais uma vez, fez-se um apóstolo da humildade para pontificar a sua fé e ensinar esperança pela força do amor de Jesus, sem se prender a qualquer proselitismo. Isso nos torna mais livres para caminhar por varadouros e navegar rios acima e abaixo sem medo de sentir o afago da Natureza ou a presença de Deus nas chuvas, no cantar dos passarinhos, nos gritos noturnos da floresta, nos ventos, na espiritualidade ancestral, nos encontros com comunidades, na experiência e nas utopias dos Pajés, seringueiros, colonos, trabalhadores humildes, estudantes, professores. E em todos esses momentos podemos sentir a inspiração amorosa de Francisco.
A presença do Papa Francisco na Amazônia é mística e secular, fluindo tanto na procura por justiça que é marca da trajetória de vida, quanto na esperança que derrama a sua profissão de fé. A encíclica Laudato Si, de 2015, é uma manifestação profética sobre as mudanças climáticas, chamando a humanidade ao dever e ao fazer da salvação da nossa Casa Comum.
O Acre manifestou sua gratidão e reconhecimento ao Papa Francisco com o Prêmio Chico Mendes de Florestania de 2018, entregue em audiência no Vaticano pela então primeira-dama do Estado, Marlúcia Cândida, a coordenadora do prêmio, Ângela Mendes, e o secretário de Estado dos Povos Indígenas, Zezinho Huni Kuin.
A inspiração divina do Papa Francisco reporta ao milagre de exemplos vividos no nosso Acre, como o idealismo socioambiental de Chico Mendes, a consciência amorosa de Bacurau e seus irmãos e irmãs da Colônia Souza Araújo, e a fé solidária aos mais pobres professada por Dom Moacyr Grechi, Frei Paulino, André Ficarelli, Heitor, Irmã Juliana, Nair, Dom Giocondo, os e as Servos de Maria – a esses tão próximos e a outros mais longe um pouco, como Dom Pedro Casaldáliga, recorremos para fortalecer nossas orações e pedir pela Amazônia ameaçada: Francisco, rogai por nós!
Tião Viana foi governador do Acre (2011 a 2018), senador também por dois mandatos e presidente do Senado Federal (2007). É médico e professor na UnB (Universidade de Brasília).
Gilberto Braga de Mello é jornalista e publicitário, MBA em marketing pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).