João Maurício Rosa
(Colaboração para Varadouro desde Sorocaba)
Ao menos sete pessoas morreram e 4,2 milhões de domicílios ficaram no escuro após as chuvas e rajadas de vento que atingiram diferentes regiões do estado de São Paulo na sexta-feira (3). A maior metrópole do Brasil permanece no escuro por mais de 72 horas. O caos após o temporal é resultado da falta de planejamento do governo bolsonarista de Tarcísio de Freiras (Republicanos), e do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que não adotaram medidas eficientes para lidar com eventos climáticos extremos junto com o governo federal. Governo e prefeitura demoraram para apresentar uma resposta eficiente à sociedade diante do apagão. Nunes classificou a tempestade como um “evento extremo”, decorrente das mudanças climáticas.
Por volta das 15 horas da última sexta, uma brisa leve se tornou ventania e começou a balançar os pés de ipês, sibipirunas, paineiras e outras variedades que arborizam as ruas e avenidas de Sorocaba, a 90 km da capital paulista.
Minutos depois, o dia virou noite, a ventania virou um vendaval de 105 km/h e uma paineira centenária, com cerca de 20 metros de altura, foi arrancada pela raiz e atirada sobre a Avenida Itavuvu, por onde corre o BRT (Bus Rapid Transit, ou ônibus de transito rápido), um arremedo de metrô, na periferia de Sorocaba.
Nestas alturas o caos já estava instalado em grande parte do estado de São Paulo com o corte de energia elétrica pelas grandes corporações que dividem o serviço em fatias na capital e no interior. No domingo pela manhã, o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil de Sorocaba contabilizavam 380 árvores a serem removidas em toda a cidade.
Embora o serviço de geração e distribuição de energia elétrica seja controlado por siglas diferentes, elas têm em comum o fato de serem multinacionais e terem passado os últimos anos cuidando de cortar despesas e ampliar os lucros. Em comum, também, todas as siglas culparam as árvores pelo apagão. “Árvores plantadas sob a rede de energia”, conforme acusou a CPFL Piratininga, distribuidora que atende Sorocaba e parte da região.
Nenhuma empresa admite que trabalha com capacidade operacional reduzida e nunca se preocupou em fazer a poda preventiva das árvores centenárias “cultivadas sob a rede”; cuidar das árvores atacadas por cupins, se antecipar à crise. E, quando a crise se instalou, nenhuma teve capacidade de dar uma resposta imediata à população, por falta de funcionários.
De acordo com levantamento da CNN Brasil, a Enel, empresa que distribui energia em toda a Grande São Paulo, cortou 36% da mão de obra desde que comprou a estatal Eletropaulo, em 2018. Atualmente, a empresa conta com apenas um funcionário para atender a chamados de cada 511 domicílios, seja residencial ou industrial.
Como consequência, a população paulista enfrentou seu fim de semana prolongado à luz de velas. No sábado pela manhã, quem não conseguia carregar seu celular no carro, correu para lojas de conveniência e shoppings em busca de uma tomada. As velas desapareceram dos supermercados, pois o apagão ocorreu justamente um dia após o Dia de Finados.
Às 10 horas da manhã de sábado, 4, a loja de conveniência de um posto de combustível no bairro Wanel Ville, em Sorocaba, estava totalmente lotada, com fila de gente esperando vagar uma tomada para carregar o celular. Enquanto esperavam, o estoque de cerveja gelada foi acabando e a proprietária providenciou um tonel de gelo para atender a demanda.
A lotação logo gerou outro problema: acabou água e a casa teve que interditar os banheiros. Restou a alternativa do banheiro dos frentistas, unissex, disponível se o cliente conseguisse abrir um cadeado.
A falta d’água chamou a atenção par outra deficiência dos serviços prestados pelas distribuidoras, que nunca se preocuparam em manter um gerador de energia próprio, apesar da fortuna que arrecadam. Segundo o governo de São Paulo, o blecaute terá reflexos até terça-feira (7), quando as distribuidoras deverão concluir os trabalhos de restabelecimento de 100% dos domicílios.
Nesta segunda-feira (6), a Aneel convocou as distribuidoras de energia que atuam no estado para uma reunião com finalidade de discutir o fornecimento do serviço nos últimos dias. O encontro promete muita mídia, pois o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), está de olho na reeleição, e promete mexer nos cofres das empresas distribuidoras. A reunião deverá ter também representantes da Enel SP, CPFL, Elektro, Energia Sul-Sudeste e EDP, que atuam no estado.
E, assim, a cidade e o estado mais ricos do país tiveram seu fim de semana de tormenta. Como se percebe, as mudanças climáticas, e seus eventos extremos, não costumam fazer acepção de pessoas.