Polarizada, disputa pela Prefeitura de Rio Branco repete cenários de 2012, mas com atores em lugares opostos
Corrida pelo maior e mais importante colégio eleitoral do Acre é protagonizada por nomes já conhecidos do eleitorado. O atual prefeito, Tião Bocalom (PL), quer se manter no cargo. Em desvantagem nas pesquisas, tem a seu favor a força do bolsonarismo. Marcus Alexandre (MDB) tenta retomar o cargo que já ocupou enquanto era filiado ao PT.
Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco
Eu vejo o futuro repetir o passado, nos diz o trecho música consagrada na voz de Cazuza. Assim pode ser definido o cenário das eleições de 2024 na corrida pela Prefeitura de Rio Branco. Tão como 12 anos atrás, a disputa pelo controle político da capital acreana está polarizada entre duas figuras conhecidas do eleitorado. O pleito será quase que um plebiscito entre a permanência ou a saída do atual prefeito Tião Bocalom (PL), ou o retorno ao cargo do ex-prefeito Marcus Alexandre, agora no MDB. Em 2012 eles duelaram a corrida municipal, mas em cenário bem oposto.
Naqueles idos, Marcus Alexandre era o candidato oficial do PT, que detinha o controle das máquinas estadual e municipal. Bocalom estava filiado ao PSDB, principal legenda de oposição. Marcus era um candidato desconhecido. Seu grande mérito foi ter ocupado a presidência do Deracre, tendo a imagem vendida como o “pai de muitas obras” no estado, incluindo a pavimentação da BR-364 entre Sena Madureira e Cruzeiro do Sul. Definido como “um poste” pelos adversários, era o candidato da máquina petista.
Mesmo na oposição, Tião Bocalom aparecia como franco favorito para vencer as eleições. Saiu com muito cacife da disputa anterior, em 2010, quando, por muito pouco, não foi eleito governador, derrotando o petista Tião Viana. Ali o Acre dava os primeiros passos em sua guinada antipetista e seu flerte com a extrema-direita reacionária representada pelo bolsonarismo, que se consolidou no poder oito anos depois, nas eleições de 2018.
Com o apoio da máquina, Marcus Alexandre foi eleito em 2012, numa campanha de marketing político que já tentava desvencilhar-lo da imagem do petismo. O vermelho sagrado do partido fora substituído pelo amarelo. Mas naqueles idos, o amarelo da Seleção ainda não tinha sido apropriado pela extrema-direita como um de seus símbolos.
Mais de uma década se passou desde aquela eleição municipal, e o Brasil passou por uma verdadeira metamorfose política, representada, sobretudo, pela ascensão do bolsonarismo. No Acre também tivemos reflexos. O estado é hoje um dos principais redutos da extrema-direita reacionária. O PT tornou-se persona non grata por estas bandas do país, após 20 anos de plena hegemonia. Na capital, a legenda não consegue hoje eleger nem mais um vereador.
Tanto assim, Marcus Alexandre precisou abandonar o partido para ter alguma chance de vitória nas eleições de 2024. A seu favor está a memória eleitoral de ser definido como um dos melhores prefeitos de Rio Branco nos últimos anos. Mesmo tendo sido este bom prefeito enquanto estava no PT, nem isso reduz a rejeição antipetista entranhada em grande parte do eleitorado. Por isso ele mudou de partido, e foi para o velho MDB – sigla que décadas atrás era o grande rival do PT nas disputas majoritárias.
Para se apresentar como este candidato do centro “desplugado” da esquerda e atrair o voto dos eleitores evangélicos, o vice dos sonhos de Marcus Alexandre precisa estar no berço neopentecostal. Ele própria declara ser evangélico, desde os tempos em que estava no PT.
As máquinas bolsonaristas
Agora com a máquina na mão, Tião Bocalom disputa a reeleição entrando em desvantagem, como apontam todas as pesquisas divulgadas até aqui. Contra ele pesa a realização de uma gestão desastrosa. Sua principal preocupação ao longo dos últimos três anos foi pintar a cidade de azul – segundo ele, para apagar o legado das gestões petistas – enquanto abandonou a infraestrutura, deixando a cidade atolada em buracos.
Após sucessivas derrotas em disputas majoritárias que disputava desde 2006, Bocalom enfim foi eleito em 2020 prefeito de Rio Branco, na esteira do bolsonarismo que domina o estado. No país, foi apontado como o único candidato do bolsonarismo eleito nas capitais, enquanto a maioria saiu derrotada. A condução desastrosa de Bolsonaro no enfrentamento à pandemia da Covid-19 teria sido uma das causas para seu fracasso naquela disputa municipal, mas não aqui por Rio Branco.
A favor de Bocalom pesa não só a força da máquina, mas também de incorporar o sentimento antipetista, de se apresentar como o candidato do ex-presidente Jair Bolsonaro, que em março veio a Rio Branco filiá-lo ao PL. Com a onda de extrema-direita conservadora que domina o ambiente político acreano, não é surpresa que este venha ser um fator a ofuscar o desastre que representa sua gestão.
No último fim de semana, Bocalom ganhou outro reforço: o apoio oficial do PP, partido do governador Gladson Cameli, que há duas semanas virou réu no Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelos crimes de corrupção apontados no inquérito da Operação Ptolomeu, da Polícia Federal, que aponta Cameli como suposto chefe de organização criminosa responsável por desviar R$ 800 milhões.
O PP indicou o vice de Bocalom, Alysson Bestene. Esta foi a mesma dupla que enfrentou e foi derrotada por Marcus Alexandre em 2012. Agora, o prefeito terá a seu favor o peso das duas máquinas e do bolsonarismo. O único (e mais importante) desafio é derrotar a elevada rejeição que ele próprio tem a capacidade de construir e fortalecer.
E, assim, as eleições municipais de 2024 passam à nossa frente como um velho filme de memórias do passado, mas com outras cenografias. Os atores são os mesmos, em posições invertidas. A campanha eleitoral está apenas no começo. Assim como 12 anos atrás, a máquina de mentiras, da desinformação e da desconstrução terá uma forte influência – e nestes tempos de redes sociais, mais forte do que nunca. A eleição na capital acreana, ao que tudo indica, é um “museu de grandes novidades”.