Dom Moacyr: o bispo dos seringueiros

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Dom Moacyr Grechi, ou apenas o Dom Moacyr, veio de São Paulo para o Acre em 1971, nomeado pelo Papa João XXIII para cobrir a ausência do bispo D. Giocondo, morto num acidente aéreo no município de Sena Madureira. Na época os povos da floresta (seringueiros, ribeirinhos e indígenas) começavam a sofrer duras ameaças de expulsão das terras que habitavam, por uma revoada de jacus financiados e estimulados pela ditadura de 64, que queriam derrubar a floresta para colocar boi. Essa briga se estendeu pelas décadas de setenta e oitenta e causou danos irreparáveis ao Estado.

Com muita fé e coragem, D. Moacyr abraçou as ideias do bispo falecido e fortaleceu a luta em favor dos fiéis ameaçados: a Prelazia do Acre e Purus se notabilizou pela organização das Comunidades Eclesiais de Base (CEBS), pelo ensinamento da Teologia da Libertação e pela engajada defesa da terra (no caso, da floresta) para quem trabalha e vive nela.

Surgiu, assim, um bispo que passou a trilhar os varadouros em canoas, montado em burros ou a pé, e que também ajudou o Jornal Varadouro a denunciar os conflitos encorajando os “empates” com base nos direitos que constam no Estatuto da Terra.

A Igreja de Dom Moacyr se tornou aliada da Contag (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura) e dos oito Sindicatos dos Trabalhadores Rurais criados no Acre projetando lideranças como Wilson Pinheiro e Chico Mendes. A luta dos povos da floresta ganhou dimensão nacional e internacional incomodando o segmento da extrema-direita do Vaticano, que o transferiu do Acre para Rondônia.

Isso contribuiu para o retrocesso que se vê hoje nas Reservas Extrativista e todo o descontrole ambiental que se verifica em nossas fronteiras. “Era um tempo muito duro, com o Exército em cima, sempre tentando intimidar”, lembrou Dom Moacyr algum tempo antes de morrer em Porto Velho, em 2019, sempre saudoso do Acre e dos acreanos.

Apesar do sobrenome de origem italiana, Dom Moacyr era brasileiro, nascido na cidade de Turvo, em Santa Catarina. Mas foi pelos varadouros da Amazônia onde ele se encontrou e escreveu sua história pessoal e de um líder religioso. Ele teve um papel essencial na história da Amazônia na década de 1970 para cá. Abria as portas da Catedral de Rio Branco para acolher as vítimas da ditadura.

Passados cinco anos desde a sua passagem, hoje sentimos falta de líderes religiosos do nível de Dom Moacyr. Ele faz muita falta para os dias atuais do Acre e da Amazônia.

Dom Moacyr em suas muitas andanças pelos varadouros e seringais acreanos para ouvir e acolher as famílias seringueiras (Foto: Cézar – Patrimônio Histórico)





Elson Martins, jornalista e escritor acreano, nascido no Seringal Nova Olinda, em Sena Madureira, criou o Varadouro na década de 1970. Foi correspondente do jornal O Estado de São Paulo, integrando a equipe da sucursal da Amazônia. Também trabalhou na imprensa do Acre, Amapá e Pará. Escreve atualmente nas páginas digitais do novo-velho Varadouro.

Contato: almanacre@gmail.com

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