Ataque mais frequente e agressivo pode ser efeito das mudanças climáticas. Produção de farinha é a principal fonte de renda para as famílias de agricultores do Juruá; apenas em Cruzeiro do Sul é responsável por 52% do PIB. Com decreto, município pode pedir ajuda federal para enfrentar a praga e suas consequências
Leandro Altheman
dos varadouros de Cruzeiro do Sul
Os agricultores do Vale do Juruá, Cruzeiro do Sul e região, já estavam, de certo modo, acostumados ao ataque sazonal do mandarová, uma lagarta que ataca os roçados de macaxeira. Ocorre que esta sazonalidade, antes demarcada por ciclos de quatro anos, tem dado indicativos que passará a ser anual, passando a ocorrer com mais frequência. Essas mudanças colocam em risco os plantios de macaxeira no Juruá e, consequentemente, do principal produto exportado pela região: a farinha de Cruzeiro do Sul. Do cultivo da macaxeira à produção da farinha, até sua comercialização, a atividade é hoje uma das principais fontes de renda para a agricultura familiar do Acre. Toda essa cadeia produtiva e econômica, agora, pode estar em risco.
Esta tem sido a avaliação de técnicos e especialistas que acompanham o avanço da praga nos roçados de macaxeira em Cruzeiro do Sul nos últimos 20 dias. A análise de cinco dias atrás era de cerca de 1000 produtores familiares atingidos pelo mandarová. Porém, o número pode estar defasado, haja visto o rápido avanço da lagarta nas plantações.
A mandiocultura é quem sustenta a principal economia da região: a produção da famosa Farinha de Cruzeiro do Sul (que em verdade é produzida também nos municípios vizinhos) e seus muitos derivados, correspondendo a 42% do PIB do município polo do Juruá. A estimativa é a de que neste ano haja redução de 50% na produtividade, trazendo prejuízos à agricultura familiar, queda na arrecadação do município, e aumento no valor da cesta básica, já que a farinha é um elemento indispensável na alimentação popular.
Segundo técnicos e agricultores, o prejuízo deste ano já é considerado irreversível. Tendo em vista todas estas questões, a prefeitura de Cruzeiro do Sul decretou, na manhã desta quarta-feira, 18, estado de emergência no município. O objetivo é buscar recursos federais para combater a praga e minimizar o impacto na renda da agricultura familiar.
Segundo o prefeito em exercício, Henrique Afonso, que acompanhou de perto o ataque aos roçados e assinou o decreto, a intenção é manter uma estrutura mobilizada anualmente contra a mandarová. “Deveremos ter um plano de contingência, de maneira similar ao que temos feito em relação à alagação”, disse ele.
O modelo de enfrentamento segue os mesmos parâmetros das enchentes típicas da Amazônia, que também ocorriam a cada quatro ou cinco anos e passaram a ser anuais. De uns tempos para cá, as grandes inundações passaram a acontecer de forma mais frequente. As cheias também são responsáveis por comprometer o cultivo da macaxeira, já que os roçados das comunidades ribeirinhas ficam inundados.
Tudo indica que a praga do mandarová, mais agressiva e frequente, seja mais um efeito colateral das mudanças climáticas, que ao contrário do que se diz, não afeta pessoas vivendo em Nova Yorque ou Paris, mas na própria região amazônica. Neste ano, o Vale do Juruá tem sido bastante afetado por um verão bem mais quente, seco e prolongado. As altas temperaturas e a falta de chuvas comprometem o cultivo da macaxeira, bem como podem contribuir para a propagação de pragas, como a da mandarová.