CONFLITOS NO PARÁ

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No Vale do Acará, liderança Miriam Tembé denuncia tentativa de homicídio e invasões a território

Miriam Tembé: se eu tiver a minha vida ceifada, “o meu sangue estará nas mãos de todos aqueles a qual eu denunciei e nada fizeram.” (Foto: Cícero Pedrosa/Cedida)



De olho em cultivos de dendê em território de recente retomada, indígenas Tembé criam conflitos entre povo e invadem território de parentes da aldeia I’ixing. Acampamento onde estava a Capitoa Miriam Tembé foi alvo de disparos feitos por pistoleiros na madrugada da última sexta; ninguém foi atingido. Uma bala acertou o parabrisa de carro usado por ela. Liderança já enviou ofícios pedindo ajuda ás autoridades, mas nada foi feito até agora.




dos varadouros de Belém


A capitoa Miriam Tembé, liderança Tembé da aldeia I’Ixing, registrou no dia 30 de dezembro, na Delegacia de Homicídios da Polícia Civil do Pará, em Belém, uma tentativa de homicídio que ela e outros moradores da comunidade foram vítimas. De acordo com seu relato, vários disparos de arma de fogo foram feitos na direção do acampamento onde estavam os indígenas na madrugada da última sexta-feira. Por sorte, ninguém foi atingido. Uma das balas acertou o parabrisa do carro usado por Miriam. Desde o início de setembro a capitoa Tembé denuncia uma série de invasões ao território da aldeia I’ixing e ameaças de morte sofridas por ela e familiares.

Já cansada de tantos pedidos e documentos enviados às instituições, a capitoa Miriam Tembé pede providências urgentes após sofrer a tentativa de homicídio. “Eles querem a qualquer custo tirar a minha vida, e as ameaças que eles estão fazendo de tirar a minha vida, por pouco não aconteceu. Como eu já denunciei, e quero mais uma vez deixar aqui muito bem informado, que se eu tiver a minha vida ceifada, o meu sangue estará nas mãos de todos aqueles a qual eu denunciei e em nenhum momento tomaram providência”, afirma a capitoa da aldeia I’ixing. (Assista ao vídeo abaixo)

As ameaças, de acordo com ela, partem de lideranças do próprio povo Tembé, das aldeias Wiranu, Turé Mariquita e Yriwar e Nova. No boletim policial, Miriam atribui a Marquês Tembé, Paratê Tembé, Raimundo Tembé e Keila Tembé o papel de líderes das invasões ao território da aldeia I’ixing. O motivo da disputa são as áreas de cultivo de dendê. Segundo o relato de Miriam Tembé, o parente Paratê Tembé teria afirmado, durante um dos momentos de discussões, que eles não tinham interesse no território, apenas na extração do dendê para ser vendido. Com a venda, eles pretendiam fazer o pagamento de dívidas.

Em ofício protocolado no dia 20 de dezembro para as mais diversas instituições federais e do Pará, Miriam Tembé relatou que os líderes das invasões contrataram o serviço de pistoleiros. A denúncia foi feita por meio da Associação Indígena Tembé do Vale do Acará (AITVA), da qual a capitoa Miriam é presidenta. A aldeia I’ixing faz parte do complexo território em retomada do Vale do Acará, que é dividido entre os indígenas Tembé, Turyuaras e mais quinze comunidades quilombolas e ribeirinhas. O território fica localizado no município de Tomé-Açu.

“Para contextualizar, o Vale do Acará foi invadido pela plantation da dendeicultura em 2008. Com isso, os povos originários e tradicionais da região foram espremidos em suas comunidades, perderam suas áreas de pesca, caça e agricultura– parte constitutivas da nossa cultura e da manutenção de nossas tradições”, informa trecho do ofício.

“Como toda monocultura, o dendê para a fabricação de biodiesel, atividade comandada pela empresa Brasil BioFuels, entre os municípios de Tomé Açu e Acará, causou fraturas irreparáveis às comunidades indígenas, ribeirinhas e quilombolas que compõem historicamente o Vale do Acará.”

Uma das consequências sociais da invasão dos territórios das populações tradicionais do Vale do Acará para o cultivo do dendê é a disputa entre as próprias lideranças – disputas que levam a divisões e ameaças de morte. No dia 8 de dezembro, houve relatos de invasões também a um território quilombola, cujo processo de reconhecimento pelo Incra está em fase avançada.

Bala atinge carro usado pela liderança Tembé; ela não estava no veículo no momento do atentado (Foto: Cedida)



Além do dendê, o Acará é bastante impactado pela mineração de grande porte no Nordeste paraense – liderando pela mineradora norueguesa Hydro. No final de outubro, Varadouro noticiou o protesto realizado pelas mulheres Tembé contra as obras de manutenção de um mineroduto da Hydro.

“Após anos de exploração, assassinatos e contaminações, retomamos nossos territórios e, portanto, os dendezais que foram plantados sobre eles sem nosso consentimento […] No entanto, alguns parentes, como mostra o exemplo em tela, parecem não ter entendido o sentido das retomadas e assumiram o papel das empresas, na medida em que incorporaram a violência, a ganância e a busca desenfreada por dinheiro, poder e terras”, sintetiza outro ponto do ofício elaborado pela associação.
















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