Brigadistas combatem incêndios florestais e protegem a Floresta Amazônica

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Documentário mostra o trabalho de brigadistas e pesquisadores no combate ao fogo na região amazônica. (Foto: Marizilda Cruppe)

Documentário curta-metragem lançado nesta sexta-feira, dia 26, em Santarém, no oeste do Pará, é o pioneiro ao retratar técnicas de combate ao fogo na região amazônica. 

dos Varadouros de Santarém.

A devastação causada por incêndios florestais, sejam criminosos ou não, resulta em perdas irreparáveis para a biodiversidade da Floresta Amazônica. Esse consenso é compartilhado por cientistas da Rede Amazônia Sustentável (RAS), conforme indicado em estudos consolidados. Aproximadamente 78% das espécies de plantas e animais sofrem redução após uma área ser atingida pelo fogo, o que significa que ela nunca mais se recupera completamente. Além disso, a perda de estoque de carbono da floresta pode ser de até 40%, o que pode agravar o efeito estufa. Diante desse cenário alarmante, os pesquisadores buscam alertar o poder público e a sociedade sobre a necessidade urgente de investir em políticas eficazes de prevenção de incêndios florestais.

Em 2015, na região de Santarém, no Oeste do Pará, cerca de 10.000 quilômetros quadrados de floresta foram consumidos pelo fogo durante uma seca agravada pelo El Niño. Já em 2023, novamente com a incidência do El Niño, foram afetados 5.000 quilômetros quadrados, uma redução atribuída em parte ao trabalho dos brigadistas, conforme destacado pelos cientistas.

A pesquisadora das Universidades de Oxford e Lancaster, e membro da Rede Amazônia Sustentável (RAS), Erika Berenguer, ressalta que a chuva também contribuiu significativamente para esse resultado. “Em 2023, houve uma incidência maior de chuvas em comparação com 2015, o que foi crucial para a redução observada. No entanto, o trabalho dos brigadistas também é um aspecto importante a ser considerado”, destaca. Os pesquisadores da RAS baseiam suas análises em dados de dois satélites, o VIIRS e o SERVIR, e com base neles constataram essa diferença significativa.

Segundo dados do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), atualmente há 29 Agentes Temporários Ambientais (ATAs) em atuação e 16 brigadistas na prevenção e combate a incêndios, totalizando 45 pessoas. Essa estrutura é muito melhor do que a que tínhamos em 2015, pois eles dispõem de mais recursos e estão mais preparados. Na imagem, é possível observar que a extensão da mancha vermelha em 2015 estava presente tanto dentro das Unidades de Conservação quanto em áreas privadas. Já em 2023, a mancha se concentrou mais nas áreas privadas, indicando que o combate dentro das unidades de conservação foi eficaz, evitando que o incêndio se alastrasse ainda mais.

Paolla Bianca Coelho, técnica ambiental do ICMBio e Coordenadora de Manejo Integrado do Fogo na Flona do Tapajós, explica que houve uma redução do número de brigadistas entre 2023 e 2024. “Tivemos uma redução no programa, mas estamos nos articulando para formar uma brigada com a Cooperativa Mista da Flona do Tapajós (Coomflona). Além disso, embora os ATAs sejam de outras áreas temáticas, temos oferecido cursos de brigadista para aqueles que têm interesse, de forma a reforçar a equipe de combate, se necessário”. Em 2023, eram 27 brigadistas em atuação e 9 Agentes Temporários Ambientais.  A Flona do Tapajós conta com 527.319 hectares.

A RAS é uma rede que trabalha principalmente com questões voltadas aos impactos ambientais causados por ações humanas. Ela conta com equipes de pesquisadores dedicados a diferentes áreas: há aqueles que focam na saúde dos igarapés e sua biodiversidade, trabalhando exclusivamente com a parte aquática; outros concentram-se em florestas secundárias, que surgem em áreas previamente desmatadas; e também há pesquisas direcionadas aos incêndios florestais. Nesse contexto, foi produzido o documentário de curta-metragem ‘Heróis do Fogo: A Luta dos Brigadistas na Amazônia’, que oferece uma visão da realidade dos homens e mulheres que atuam diretamente na linha de frente do combate às chamas e evidencia as consequências do fogo na Amazônia.”

Os impactos 

Ver imagens de uma floresta devastada é impactante, mas para quem está próximo, o choque é ainda maior. Marcos Jesus de Oliveira, 33 anos, nascido em Santarém e residente na BR-163, atua como brigadista há nove meses. Para ele, não há cena mais triste do que testemunhar uma floresta em chamas. “É muito triste ver um lugar antes preservado consumido pelo fogo. Tudo queimando, cheiro de fumaça, os animais morrendo, fugindo, tentando, mas nem sempre conseguindo escapar do fogo. Isso choca bastante a gente. Isso impacta profundamente”, relata.

As chamas por si – que chegam a até 15 metros de altura –  já são um grande impacto, mas Marcos conta que as crianças e idosos que moram nas comunidades são os que mais têm a saúde afetada. “As pessoas sofrem muito, pois são obrigadas a inalar muita fumaça, o que prejudica a saúde de todos, inclusive dos próprios brigadistas que escolhem realizar esse trabalho”. 

Para Marcos, o filme é uma oportunidade para as pessoas compreenderem a realidade amazônica. “Eu acredito muito no trabalho que faço e penso que se não fosse pelo trabalho dos brigadistas a propagação do fogo seria ainda maior”, destaca.

Em 2023, cerca de 5.000 quilômetros quadrados de floresta foram consumidos pelo fogo (Foto: Marizilda Cruppe)

O documentário 

A ideia de produzir o documentário surgiu inicialmente de uma demanda dos próprios brigadistas. A pesquisadora Erika Berenguer, conta que passou o segundo semestre de 2023 acompanhando o trabalho das brigadas e realizando medições de incêndios florestais. Na ocasião, os trabalhadores compartilharam com ela e com o pesquisador britânico Jos Barlow, que trabalha com fogo em Reserva Extrativista (Resex) desde 1998, não haver um um material voltado sobre fogo na Amazônia. Surgiu então, a ideia de construir um material técnico para auxiliar o trabalho de brigada do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio); do PrevFogo Ibama; ou de brigadas voluntárias. “No entanto, durante o processo de produção do filme, percebemos que o tema era muito amplo e que o documentário poderia servir para alertar e levar a um maior entendimento dos incêndios florestais na Amazônia e seus impactos”.

Erika Berenguer explica que há quatro tipos de fogo de queimadas na Amazônia: o primeiro é o para limpeza de pastagem, nele o fogo é utilizado para queimar árvores que estão nascendo em área de pastagem, o que pode ser considerada uma técnica de manejo do pasto, onde depois de queimado é plantado a braquiária para nascer o capim; o segundo é o roçado utilizado para cultura de subsistência em terras com 0,5 hectare, o equivalente a meio campo de futebol; o terceiro tipo é o fogo do desmatamento que é o mais comum, quando uma área derrubada é queimada; o quarto tipo são os incêndios florestais, que é o analisado no documentário. Os incêndios ocorrem mais comumente em anos de seca extrema, ainda que haja registros todos os anos. O filme análise dois eventos extremos, a seca 2015 e 2023, ambas agravadas pelo fenômeno do El Niño. Com o clima mais seco, o fogo da limpeza de pastagem, do roçado ou do desmatamento escapam para a floresta ocasionando os incêndios florestais. 

Esse processo é mostrado no documentário, que levou dois meses para ser finalizado. O documentário é o primeiro voltado para a realidade da região amazônica, que apresenta as características específicas do combate ao fogo na região. Até então, os brigadistas, ainda que realizassem o trabalho, faziam o treinamento com vídeos dos biomas do Cerrado e Pantanal, inclusive, com equipamentos que não eram adequados para a Amazônia. 

Na região é preciso, por exemplo, usar um soprador para tirar folhas ou materiais combustíveis do chão, no Cerrado e Pantanal é usado um abafador de borracha, utilizado para combater incêndios rasteiros, extinguindo o fogo por abafamento. Na Amazônia também é preciso enxada, foice e motosserra. 

Uma das técnicas utilizadas e mostradas no documentário são os chamados aceiros, uma espécie de caminhos de dois metros de largura sem nenhum material combustível como folhas secas ou galhos de árvore. “O solo fica exposto e o soprador é utilizado para auxiliar nesse processo, porque como o solo está exposto não tem combustível e sem combustível o fogo morre”.  

A bióloga Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental (Belém,PA) e membro da RAS afirma que os incêndios florestais na Amazônia são de ordem ambiental, mas também social e que as previsões climáticas com secas extremas se tornarão mais comuns. “Esse é o resultado da ação humana. As florestas perturbadas, ou seja, as que foram desmatadas ou impactadas pela extração ilegal de madeira e pelas queimadas, contribuem diretamente para a emissão de gases do efeito estufa.”

Além disso, a pesquisadora pontua que a mudança de estrutura da floresta e a perda dessas espécies, sejam animais ou plantas, assim como os impactos para as pessoas que dependem da floresta para garantir sua subsistência precisam ser analisados com atenção. “Os incêndios florestais afetam a todos nós, direta ou indiretamente, pois o planeta é um só e os impactos são globais”. 

Uma parte desse cenário de destruição é retratado no filme: castanheiras centenárias e outras árvores e vegetação consumidas pelas chamas; animais queimados, vítimas dos incêndios, e o relato de pessoas e moradores das comunidades tradicionais relatando problemas de saúde como falta de ar e ausência de visibilidade devido à fumaça excessiva.

O documentário de curta-metragem “Heróis do Fogo: A Luta dos Brigadistas na Amazônia” foi concebido por Jos Barlow, Erika Berenguer e Joice Ferreira, realizado pela RAS, financiado pela Lancaster University e UKRI, com apoio da Embrapa, University of Oxford, PELD, CNPq, ICMBio e BNP PARIBAS. A produção é da Banksia Films, com roteiro e direção de Carolina Fernandes e fotografia de Lúcio Silva e Marcos Antônio Rodrigues.

Onde assistir: O documentário “Heróis do fogo: a luta dos brigadistas na Amazônia” ficará disponível, online, na página e Canal de Youtube da Rede Amazônia Sustentável.

Página RAS: https://ras-network.org/

Youtube: Heróis do fogo: a luta dos brigadistas na Amazônia

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