ÁREAS (UM POUCO MAIS) PROTEGIDAS

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Resex Chico Mendes e Jaci-Paraná apresentam redução em taxas de desmatamento

Resex Chico Mendes: UC acreana está entre as mais desmatadas da Amazônia desde 2019; após anos sucessivos de devastação, área derrubada apresenta queda (Foto: Alexandre Cruz Noronha)



Especialistas ouvidos por Varadouro comemoram os resultados, mas defendem que as quedas do desmatamento em áreas protegidas não ocorram apenas por ações de comando e controle. Para eles, tanto importante quanto a repressão é a adoção de políticas de valorização e fomento a uma economia de base florestal, além de agricultura familiar, assegurando renda e qualidade de vida para as comunidades.




dos varadouros de Rio Branco
e de Porto Velho



Quando o assunto era falar sobre o avanço do desmatamento em unidades de conservação (UCs) durante o governo Jair Bolsonaro (2019-2022) na Amazônia, as Reservas Extrativistas (Resex) Chico Mendes, no Acre, e Jaci-Paraná, em Rondônia, tornaram-se símbolos de um período de devastação. Não por acaso, as duas áreas protegidas estão em municípios inseridos dentro da chamada zona de desenvolvimento sustentável (ZDS) Amacro, cujo principal legado é a expansão não apenas da fronteira agrícola, mas também de uma série de crimes ambientais na tríplice divisa Amazonas, Acre e Rondônia. Do ponto de vista geográfico amazônico, pode-se dizer que as duas UCs são quase vizinhas, pois abrangem os territórios das capitais Rio Branco e Porto Velho.

As duas UCs também foram alvos de proposições legislativas que visavam a desafetação de suas áreas. As propostas foram apresentadas pelas bancadas da motosserra dos respectivos estados. No caso da Resex Chico Mendes (UC federal), por meio do Projeto de Lei 6024, apresentado em dezembro de 2019 na Câmara dos Deputados. Já a Resex Jaci-Paraná (UC estadual) por muito pouco não foi extinta com a aprovação do Projeto de Lei Complementar 80/2020, votado pela Assembleia Legislativa de Rondônia. Sanciobado, o projeto foi considerado ilegal pela Justiça. O PL 6024 definhou ainda nas comissões da Câmara.

A boa notícia é que, após anos de pressões e devastação, o desmatamento nas duas unidades de conservação registraram quedas expressivas em 2023, quando o Brasil iniciou o processo de retomada de sua política ambiental. De acordo com o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a área de floresta derrubada na Resex Chico Mendes no ano passado foi de 24 km2; em 2022 ela chegou a 84 km2 – uma queda de 71%. Os dados foram divulgados nesta terça-feira (23).

A diminuição do desmatamento na Resex Jaci Paraná é de 64%; foram 42 km2 de mata derrubada durante o último ano do governo Jair Bolsonaro, e de 15 km2 em 2023. A APA Triunfo do Xingu, no Pará, foi a líder em queda da área devastada; saiu de 420 km2 em 2022, para 83 km2 ao longo do ano passado. Das dez unidades de conservação com os maiores registros de quedas, todas estão no Acre, no Pará e em Rondônia. (veja tabela)




“Essa redução expressiva do desmatamento em áreas protegidas é muito positiva, pois são territórios que precisam ter prioridade nas ações de combate à derrubada. Isso porque, na maioria das vezes, a devastação dentro de terras indígenas e unidades de conservação significa invasões ilegais que levam a conflitos com os povos e comunidades tradicionais que residem nesses territórios”, explica o pesquisador Carlos Souza Jr., coordenador do Programa de Monitoramento da Amazônia do Imazon.

“Estes dados marcam o retorno das políticas de controle ambiental do país e do estado também, mas eu acho que é preciso manter as fiscalizações fortes e ações em prol das comunidades, fortalecendo as cadeias produtivas baseadas na floresta e numa agricultura mais sustentável”, afirma Sonaira Silva, coordenadora do Laboratório de Geoprocessamento Aplicado ao Meio Ambiente (Labgama) da Universidade Federal de Acre (Ufac) Campus Floresta, em Cruzeiro do Sul.

Para ela, a redução precisa ser comemorada, mas é apenas o começo do processo de reconstrução, após o período de enfraquecimento das políticas ambientais, com a consequente expansão das taxas de desmatamento, inclusive em unidades de conservação.

A pesquisadora lembra que, mesmo com a retomada das ações de fiscalização e controle, muitos dos invasores que se apropriaram de áreas da Resex Chico Mendes, por exemplo, continuam como “proprietários”. “Não houve um processo de desapropriação. Eles estando lá é preciso ter um monitoramento constante.” Na opinião dela, esse cuidado é necessário por a grande maioria destes novos moradores não terem um perfil extrativista.

Secretário-geral da organização SOS Amazônia, Miguel Scarcello comemora os resultados de queda do desmatamento nas áreas protegidas, mas defende que ela ocorra não apenas a partir das ações de repressão aos crimes ambientais – o que não deixa de ser importante. “O papel de polícia está sendo muito bem feito, tanto pelo ICMBio quanto pela Polícia Federal. Agora eu queria ver essa tendência [de queda] a partir de um outro ponto de intervenção. Este poderia ser o melhor sinal que receberíamos. Não se mudou a base de produção para que essas áreas protegidas se mantenham sem desmatamento”, diz Scarcello.

Para ele, é importante a adoção de modelos e projetos que incentivem a valorização de modelos econômicos que assegurem a ampliação da renda das famílias que vivem nas reservas extrativistas, sem a necessidade de desmatamento.

Na análise de Paulo Bonavigo, diretor da organização Ação Ecológica Guaporé (Ecoporé), em Rondônia, os dados do Imazon mostram que, quando o Estado, o poder público, tem interesse, é capaz de conter as invasões às unidades de conservação.

“Ainda temos muito por fazer. Ainda temos muitas unidades invadidas até agora, estaduais e federais. O Estado precisa punir estes invasores, e também quem incentivou e financiou as invasões. Isso é caro. Provavelmente quem estimulou essa invasões não está lá dentro. É preciso chegar a quem estimulou”, ressalta Bonavigo. Ele defende que os recursos obtidos a partir das multas aplicadas aos estimuladores da grilagem em UCs sejam usados para recuperar áreas desmatadas.

Resex Chico Mendes: PL 6024, grilagem, vendas de lotes. Unidade sofreu variados processos de pressões a partir de 2019 (Foto: Divulgação SOS Amazônia)



Rondônia é um dos estados da Amazônia com os maiores registros de pressões sobre suas unidades de conservação – sobretudo as estaduais. A desafetação e a completa extinção destas áreas é o principal objetivo da classe política local. O próprio Poder Executivo atua para a extinção das áreas protegidas, vista como entraves para o avanço da pecuária e da plantação de soja.

A Resex Jaci-Paraná é, sem dúvidas, o símbolo deste ataque histórico à preservação da floresta em Rondônia. A redução do desmatamento detectado em 2023 pode ser o sinal de reinício de uma recuperação do território pelo Estado – este mesmo Estado que foi tão omisso ante os inúmeros crimes praticados contra as unidades de conservação.





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