Seca extrema faz rio Acre começar novembro em nível crítico de vazante
Manancial chegou a medir 1,45m na manhã deste dois de novembro; volume 50% abaixo da média histórica para o mês. Projeções são as de que rio continue em déficit hídrico até o fim do ano. Outubro, novembro e dezembro deveriam ser os meses de consolidação do inverno amazônico.Crise climática torna período seco mais quente e prolongado
FABIO PONTES
Dos varadouros de Rio Branco
Em tempos passados, não muito distante, a chegada dos meses de outubro e novembro era sinônimo de alívio para os moradores dos municípios localizados mais ao sul da Amazônia ocidental. Era o período que se findava o verão, e começava o inverno amazônico. As primeiras chuvas serviam como um alívio após quase cinco meses de muito calor e secura. No Norte, a vida da população é movida pelo calendário natural do clima, ou melhor dizendo, pelo inverno e o verão amazônico: seis meses de estiagem e seis meses de muita chuva. Porém, nada é mais como dantes.
Em Rio Branco, por exemplo, chegamos ao mês de novembro com o rio Acre ainda registrando níveis críticos de vazante, quando já deveria estar aumentando o volume de água com as chuvas iniciais desta época do ano. O problema é que falta chuva. O manancial está em situação de alerta ao menos desde o fim de junho, isso após ter registrado a terceira maior enchente da história entre março e abril, ao atingir 17,72m na capital acreana, deixando milhares de desabrigados ao longo de seu curso.
Neste dois de novembro, o rio Acre registrou o nível de 1,45m. Na comparação com o primeiro dia do mês, houve uma tímida elevação de três centímetros. De Assis Brasil (nas cabeceiras) até Porto Acre, todas as medições realizadas pela Defesa Civil apontam o manancial num volume abaixo das cotas de alerta e de alerta máximo – conforme estabelecido por cada estação de monitoramento. O mesmo acontece com o seu mais importante afluente na região de Rio Branco, o Riozinho do Rola, cujo volume de água no começo de novembro é de 1,12 m.
“Nós nunca tivemos um nível do rio Acre, para esta época do ano, tão crítico como ele está agora. A média histórica para o início de novembro é entre três a quatro metros. Nós estamos com 1,45m. Ou seja, nós não temos nem a metade da média esperada para novembro. Isso demonstra a criticidade da seca que nós estamos enfrentando em 2023”, afirma o tenente-coronel Cláudio Falcão, coordenador da Defesa Civil de Rio Branco.
De acordo com ele, a partir das previsões meteorológicas, não há perspectivas de melhoras significativas do volume do rio Acre ao longo de novembro, assim como também em dezembro – quando o inverno amazônico deveria estar em seu ápice. Segundo Falcão, há projeções de saída da situação crítica apenas a partir de janeiro. “Até o fim do ano, mesmo com o nível melhorando, continuaremos em déficit hídrico. Nós não teremos o mesmo volume de água que é esperado para os meses de novembro e dezembro.”
A seca extrema vivida neste ano de 2023 é atribuída ao fenômeno climático El Niño, que é o aquecimento das águas na região do Pacífico Equatorial, localizada entre a costa do Peru e do Equador. Uma de suas consequências para o clima global é a escassez de chuva na Amazônia. Os rios da Bacia Amazônica – como Solimões, Negro, Branco, Amazonas, Madeira, Tapajós Juruá, Purus e outros – alcançaram volume crítico de vazante, deixando centenas de comunidades isoladas, sem acesso à àgua e comida, além da morte de espécies aquáticas.
Na capital acreana, a prefeitura realiza a distribuição de água potável em ao menos 27 comunidades – entre rurais e urbanas. Segundo o coordenador da Defesa Civil, já são quase 17 milhões de litros de água fornecidos para mais de quatro mil famílias. Falcão afirma que a prefeitura fez a compra de 25 milhões de litros, e que a Operação Estiagem estende-se até 15 de dezembro. O coordenador afirma que, por conta da seca extrema, a prefeitura pode ampliar o número de comunidades atendidas para 30 – e isso em pleno novembro.
Cláudio Falcão afirma ver com muita preocupação o rio Acre chegar a novembro em níveis críticos. Para ele, é necessária a adoção de políticas públicas que venham a mitigar os impactos das mudanças climáticas. Segundo ele, o prolongamento do período seco não acontece só em 2023, mas se intensificou com o El Niño. Desde 2021, afirma o oficial, são observados verões amazônicos mais extensos do que anos anteriores.
Nesse primeiro de novembro, o governo federal, por meio do Ministério da Integração Nacional, publicou portaria no Diário Oficial autorizando o empenho e o pagamento de R$ 8,2 milhões para o governo acreano desenvolver ações de mitigação da seca extrema para as comunidades impactadas. O estado terá prazo de 180 dias para executar as ações emergenciais. No começo de outubro, o governo decretou situação de emergência ambiental para todo o Acre.
Outros mananciais
Situação semelhante de vazante crítica é observada em outros rios acreanos. No alto Juruá o status é de atenção. Em Marechal Thaumaturgo, o rio media 3,14m em primeiro de novembro. A cota de alerta é de 2,50m. Em Cruzeiro do Sul, o Juruá estava em 3,89 m (cota de alerta 3,30m). O rio Liberdade, importante afluente do Juruá, registrava 1,42 m – apenas 12 cm acima da cota de alerta. Apesar de um certo quadro de “tranquilidade” as bacias do Envira/Tarauacá também não estão num volume de água tão alto, comum para o que deveria ser o inverno amazônico.
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