Alerta em Rondônia: ”Estão destruindo um grande aquífero”
Montezuma Cruz
Dos varadouros de Porto Velho
A seca e as agressões ambientais no entorno de rios em Rondônia se chocam contra os Objetivos do Milênio. “Estão desmatando ao redor de rios em diversas regiões do estado, o gado bovino bebe água suja e quente”, lamentou esta semana o senador Confúcio Moura (MDB-RO). Ex-governador em dois mandatos, durante os quais apelava a Brasília para o combate ao roubo de madeira nobre na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau (região central do estado), Moura ainda atrai para si um olhar desconfiado de integrantes do agronegócio. Mas ele não abre mão desse discurso.
Mesmo presidindo a poderosa Comissão de Serviços de Infraestrutura, o senador é amigo dos principais líderes indígenas de Rondônia, mantém diálogo permanente com todos eles, e não tem visão radical contra atuação de organizações não-governamentais.
Moura é um dos únicos parlamentares de Rondônia que consegue dialogar com a comunidade ambiental e propor políticas públicas para o setor. Demais integrantes da bancada federal e da Assembleia Legislativa defendem a substituição de florestas por pastagens para gado e fazem de tudo para expulsar os povos tradicionais de seus territórios já tão agredidos durante o processo de ocupação das terras que hoje formam Rondônia.
Faltou água potável
“Quase todos os rios, 90%, nascem no mesmo lugar, no estado: o Jamari, o Candeias, o Santa Cruz, todos eles vêm da Serra dos Pacaás-Novos”, lembra o parlamentar. “Lá perto de Campo Novo de Rondônia, no alto, a mil metros de altitude, nascem o Rio Urupá, que desce até o Rio Machado; o Rio Cautário em Costa Marques (na fronteira brasileira com a Bolívia); o Rio Pacaás, que vai até Guajará-Mirim. Estive lá e me deparei com o desmatamento do grande aquífero de Rondônia!”, aponta.
Em comunidades ribeirinhas dos rios Guaporé, Mamoré e Madeira também faltou água potável este ano.
Ao Varadouro Moura disse ter notado em suas viagens pelo interior de Rondônia “imensos rios com águas barrentas.” “O indígena e o ribeirinho estão sem água lá no alto, então, estamos colocando estações de produção de água com poço artesiano e construindo caixas-d’água para atender essas comunidades: temos cinco, vamos chegar a 15, mas precisamos mesmo de quinhentas”, ele afirma.
“Destruir o formador de mananciais, secar os rios que conduzem água às hidrelétricas é crime bárbaro, de guerra; o pior é que quando há fiscalização e multa aos infratores, eles ficam com raiva e alegam que o Ibama está apelando.”
Na semana em que ele fez essas declarações, Cacoal (86 mil habitantes) amargava crise hídrica. Ali, conforme levantamentos do consultor ambiental Adilson Pepino, aproximadamente quinhentas nascentes foram aterradas ao longo de 40 anos.
Espigão do Oeste (30 mil habitantes) viveu situação pior que a de Cacoal, que possui serviço autônomo de água. A Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia (CAERD) teve que canalizar água de uma barragem, levando-a para o Rio Palmeiras, de onde foi tratada e distribuída em caminhões-pipa do Departamento de Estradas de Rodagem.
“É um crime de guerra o desmatamento no entorno da Serra dos Pacaás-Novos; alguns rios assorearam, perderam o leito e formaram um cenário tétrico”, lamenta o senador.
Para Moura, a situação dramática chama atenção para as intempéries da Natureza: “Ela castiga, sabe, ela é poderosa, e a gente vê a floresta, os rios, o clima, pensando que nada irá mudar; eu vou desmatar, queimar e poluir, o homem decide, mas o custo disso tudo é muito alto.”
Quanto custa um rio?
“Quanto custa um rio? Quanto se pagaria pelo Rio Jamari com água e peixes, se ele fosse vendido? Não tem preço, e isso indica a necessidade de mudarmos a nossa mentalidade”, questiona o senador.
“Dá para plantar soja? Dá. Para criar boi? Dá. Mas é preciso respeitar a política ambiental e não sair aí destruindo tudo. Eu viajo muito de avião sobre o estado de Rondônia e vejo pastagens imensas sem água. O fazendeiro, o que faz? Leva lá uma escavadeira, faz um açude, e a água bebida pelo gado é suja e quente.”
Quando o volume baixa, explica Moura, a situação piora, porque o gado sem água “fica zanzando estressado, perde peso e as vacas não irão parir normalmente causando prejuízos inevitáveis pela falta de cálculo e planejamento.”
Aquífero Parecis
Antigamente, a maior parte dos sítios e fazendas rondonienses tinham água, mas suas nascentes há algum tempo secaram. Isso prejudica os produtores, cujo cadastro ambiental rural conta com esse ponto positivo para lhes abrir as portas bancárias.
De acordo com o Serviço Geológico do Brasil (antiga Companhia de Pesquisas de Recursos Minerais), o aquífero Parecis é o maior estado, onde estão localizados os poços tubulares com as maiores vazões de Rondônia, atingindo até 264 m³/h e fica na cidade de Vilhena, na região do Cone Sul.
Já a rede hidrográfica de Rondônia é representada pelo Rio Madeira e seus afluentes, que formam sete bacias significativas: Bacia do Guaporé, Bacia do Mamoré, Bacia do Abunã, Bacia do Madeira, Bacia do Jamari, Bacia do Machado (ou Ji Paraná) e Bacia do Rio Roosevelt. Todas as bacias impactadas pela ação humana.
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