Disparos de arma de fogo tiram a paz dos Uru-Eu-Wau-Wau; Kanindé pede a Força Nacional

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Montezuma Cruz
Dos varadouros de Porto Velho

Tiros ecoam pela mata, atemorizando os indígenas Uru-Eu-Wau-Wau. O filme se repete desde os anos 1980, após o contato: madeireiros, garimpeiros, caçadores e grileiros ocupam várias partes do território, intocáveis. Os últimos disparos ouvidos foram no início deste mês, informa em nota a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, que pede agora providências urgentes contra invasores. A situação assusta.

“A coordenação da Kanindé vem a público manifestar sua solidariedade ao coordenador da Funai na Frente de Proteção Etnoambiental Uru-Eu-Wau-Wau (Fabrício Amorim) e aos indígenas que foram atacados a tiros no dia 3 de julho por um invasor que estava caçando dentro da Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, na região dos indígenas isolados, próximo à base Bananeira, em Rondônia”, diz a nota.

A Kanindé lamenta que o ataque tenha ligações com políticos. Conforme apurou a Polícia Federal, os tiros configuram mesmo tentativa de homicídio contra Amorim e dois indígenas Jupaú (Uru-eu-wau-wau). Os suspeitos são: o marido da vereadora Solange Emílio (PSD), Edmilson Vitor da Silva, e o primeiro filho deles, de Seringueiras – todos com prisão decretada por 30 dias.

Ainda segundo a PF, Fabrício esforçava-se para retirar da área “caçadores suspeitos”.

A violência contra o Povo Uru-eu-wau-wau vem de longe. Eles foram contactados em 1980 pelo falecido sertanista Apoena Meireles. A região onde está a terra indígena é muito cobiçada.

Em abril de 2020, o professor e agente ambiental Ari Uru-Eu-Wau-Wau foi encontrado morto, com marcas de pancadas. O Júri Popular da Comarca de Jaru condenou a 18 anos de pena o comerciante João Carlos da Silva, como autor do homicídio.

Queimada nos anos 1980 (Foto Kim-Ir-Sen-Pires Leal)

Leia no Varadouro: Justiça realizada

Mais grave que os fatos é a constante falta de solução para os problemas nas TIs amazônicas. Ministério Público Federal e Funai já denunciaram ameaças de reiteradas invasões de posseiros, admitem a articulação de políticos e fazendeiros. No entanto, não se veem ações enérgicas desencadeadas para prender novos e velhos atores.

Durante o segundo governo em Rondônia, o médico e atual senador Confúcio Moura (MDB) pedia socorro a Brasília, a fim de preservar o patrimônio desse povo cuja postura em defesa da floresta é notável, mesmo assim, uma única vez se tornou visível às autoridades, na Operação Verde Brasil,

Força Nacional

“Solicitamos urgentemente providências para a renovação da portaria MJSP n. 666 de 19/04/2024 que mantém a Força Nacional na Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, considerando o perigo ao qual estão expostos os indígenas, servidores da Funai, ICMBio e entidades parceiras”, apela a nota.

Em setembro de 2023, as entidades Conectas Direitos Humanos, Associação Etnoambiental Kanindé, Associação Jupaú, Instituto Maíra e Associação Kowit lançaram o relatório Vidas em territórios sob pressão: povos Uru-Eu-Wau-Wau, Paiter Suruí e Arara.

Entre 2020 e 2021, a 2ª Operação Verde Brasil, do Exército Brasileiro e colaboradores, conseguiram o seguinte resultado em Rondônia e na Amazônia Ocidental Brasileira:

  • número de ações: 919;
  • número de incêndios combatidos: 356;
  • aérea embargada de incêndios: 54.777,33 hectares;
  • prisões: 44;
  • termos de infração e multas: 454;
  • madeireiras visitadas: 94;
  • apreensões de madeiras: 56.745.519 metros cúbicos;
  • embarcações apreendidas: 74;
  • veículos apreendidas: 81;
  • armas e munições apreendidas: 33 e
  • apreensão de drogas: 16,250kg.

Ações e fiscalização chegaram a 47 localidades de proteção ambiental – entre entre terras indígenas e reservas extrativistas e biológicas – 16 delas no Estado do Acre e em 13 pontos geográficos do Sul do Amazonas.

No total, naquela ocasião os órgãos ambientais aplicaram multas no total de R$ 359,8 milhões e apreenderam madeira, no que resultaram mais multas, no valor de R$ 100 milhões. A operação fora comandada pela 17ª Brigada de Infantaria de Selva, que reuniu uma força-tarefa conjunta integrada responsável por 919 ações, incluindo patrulhas terrestres, fluviais e reconhecimento aéreo.

Exército trabalhou bem, quatro anos atrás em Rondônia, Acre e Sul do Amazonas (Foto Daiane Mendonça – Secom RO)

A operação combatia a mineração ilegal, bloqueava estradas para fins de vistorias, paralisando a ação de pessoas que cometeram algum tipo de infração.

E nunca mais os pelotões fardados e armados adentraram a floresta, percorreram rios ou fizeram voos de reconhecimento, dando margem à descontinuidade de ações pontuais e de resultados, que podem inibir agressores da natureza.

● Em 2019 aumentaram as denúncias de invasão a terras indígenas no Brasil. Em cinco dessas TIs ocorreram: roubo de madeira, derrubada de floresta para pastagens e abertura de picadas e até a escolha de lotes para ocupação ilegal.

● Povos Uru-Eu-Wau-Wau e Karipuna, ambos em Rondônia, identificaram picadas. No Pará, a TI Arara; no Maranhão a TI Arariboia foram invadidas por madeireiros e a grileiros, ambos agindo em terras demarcadas.

● Com a posse do ex-presidente Jair Bolsonaro e a ascensão de políticos conservadores, essa situação repercutiu muito também no entorno das TIs Marãiwatsédé, em Mato Grosso, e Awá, no Maranhão.

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