A mídia brasileira e o indulto natalino

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O ano de 2023 está chegando ao fim, e o cenário político brasileiro parece ser envolto em uma teia de controvérsias e sensacionalismo midiático. A imprensa nacional, outrora um farol da informação objetiva, parece ter perdido seu rumo quando o assunto é política. Em meio a esse panorama, uma decisão do presidente Lula se tornou o epicentro de um furor midiático que revela não apenas a polarização política, mas também a decadência ética da mídia brasileira.

O indulto natalino, uma tradição anual prevista na Constituição, tornou-se a pedra de toque das discussões na sociedade. O presidente Lula, ao exercer sua prerrogativa de conceder perdão de pena, não imaginava que desencadearia uma tempestade midiática. A escolha de beneficiar, ou não, os envolvidos nos eventos do 8 de janeiro tornou-se o foco de uma narrativa distorcida, habilmente moldada por veículos de comunicação ávidos por audiência a qualquer custo.

O indulto natalino é um gesto de clemência que, historicamente, transcende questões partidárias. Entretanto, a mídia brasileira parece ter abandonado qualquer resquício de imparcialidade, transformando um ato presidencial rotineiro em uma novela polarizada. A insistência em retratar o indulto como uma obrigação moral do presidente, especialmente em relação aos chamados “terroristas do 8 de janeiro”, revela uma agenda midiática que não hesita em sacrificar a veracidade em prol da narrativa.

Ao invés de fornecer à população uma análise equilibrada e informativa, a mídia tem se dedicado a pintar o presidente como o vilão de uma trama política. Ignorando as nuances e os requisitos legais para o indulto, os veículos de comunicação parecem mais interessados em alimentar o sensacionalismo e promover uma polarização que inflama os ânimos da sociedade.

A Constituição é clara em relação aos critérios para o indulto natalino, estabelecendo requisitos específicos que devem ser cumpridos pelos beneficiados. Homens e mulheres, reincidentes ou não, têm seus critérios definidos de forma precisa. No entanto, a mídia, em sua ânsia por manchetes impactantes, prefere distorcer a realidade e retratar a concessão do indulto como uma escolha arbitrária do presidente.

É imperativo compreender que o indulto natalino não é um cheque em branco para criminosos. Há critérios a serem cumpridos: um quinto da pena para não reincidentes e um quarto para reincidentes, no caso de mulheres; um quarto da pena para não reincidentes e um terço para reincidentes, no caso de homens. Estas são regras estabelecidas para garantir que o benefício seja concedido com base em mérito, não em favorecimentos políticos.

Ao abordar essa questão, a mídia deveria desempenhar o papel de informar, educar e provocar o pensamento crítico. Em vez disso, vemos uma narrativa que mais se assemelha a um espetáculo sensacionalista, onde a verdade é frequentemente sacrificada em prol de manchetes cativantes.

Neste cenário, fica evidente que a mídia brasileira está empobrecida não apenas em termos de recursos financeiros, mas, mais preocupantemente, em termos éticos. A busca incessante por manchetes sensacionalistas tem eclipsado a responsabilidade jornalística de informar e educar o público. A falta de análise crítica e a adoção de posições pré-concebidas comprometem a integridade do jornalismo, deixando a população refém de narrativas tendenciosas.

À medida que nos aproximamos do final de 2023, é imperativo refletirmos não apenas sobre as decisões políticas, mas também sobre a qualidade do jornalismo que consumimos. O indulto natalino, uma tradição que deveria simbolizar compaixão e reflexão, tornou-se um campo de batalha midiático. A sociedade brasileira merece mais do que uma narrativa distorcida; ela merece uma mídia que esteja à altura do desafio de informar com precisão e promover o entendimento em uma sociedade já demasiadamente dividida.



Nascido nos seringais de Xapuri, Pitter Lucena é jornalista e escritor. Deu os primeiros passos nos varadouros das letras no início da década de 80, quando estudou Teologia dentro do projeto das Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica no Acre. Em 1985 entrou para o mundo do jornalismo. Trabalhou como repórter nos jornais Folha do Acre, O Rio Branco, A Gazeta e A Tribuna, além das emissoras de TV. Em 2003 ganhou o prêmio de jornalismo José Chalub Leite por reportagens sobre o esquadrão da morte no Acre. É bacharel em Comunicação Social, jornalismo, pelo Instituto de Educação Superior de Brasília – Iesb.

pitter.lucena@gmail.com






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