A FÉ QUE TRANSBORDA O JURUÁ

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Novenário de Nossa Senhora da Glória: fé e devoção em honra a padroeira da capital do Juruá

Milhares de devotos tomam as ruas e as consagradas ladeiras de Cruzeiro do Sul em procisão a Nossa Senhora da Glória; ribeirinhos saem das comunidades mais longínquas do Juruá para momento de devoção



ESSA SEMANA foi realizada, em Cruzeiro do Sul, uma das mais importantes festas religiosas da região Norte do país, o Novenário de Nossa Senhora da Glória. Este é o momento em que milhares de pessoas peregrinam pelas ruas e as consagradas ladeiras da segunda maior cidade acreana. São pessoas que passaram horas e até dias navegando por rios e igarapés – ou até mesmo em caminhadas por varadouros no meio da selva – para chegar até a sede urbana de Cruzeiro do Sul para este momento de fé e devoção com a padroeira do Juruá.

A escritora Val Martins traz aos leitores do Varadouro espalhados pelo Acre e o mundo um relato sobre este momento tão especial e aguardado por milhares de moradores da floresta espalhados pela imensidão verde do Vale do Juruá – um lugar que, por si só, já pode ser considerado sagrado por toda a exuberância de vida guardada dentro de suas matas intocadas.


A seguir, o relato de Val Martins desde os Varadouros de Cruzeiro do Sul

“Ah, minha irmã, eu acho que a minha devoção por ela foi desde que eu me entendi de gente, que eu comecei a rezar. Mamãe começou a ensinar nós rezar e nós se apeguemos com Deus e com ela (…). Nós temos pai, nós temos que ter mãe, né”. É o que responde dona Francisca do Socorro quando pergunto a ela sobre quando começou sua devoção a Nossa Senhora da Glória.

De pele escura, cabelos grisalhos e olhar cativante, Socorro, assim como é conhecida, tem 57 anos e é agricultora “nascida, crescida e casada” no rio Gregório, no município de Tarauacá.

A viagem da comunidade 1º de Junho, onde mora Socorro, até a cidade de Cruzeiro do Sul, onde ocorre o tradicional novenário em honra a Nossa Senhora da Glória, demora três dias de “canoinha pequena”. Ela conta que já faz esse percurso há 28 anos e, dessa vez, veio acompanhada do marido e de um dos seus onze filhos. “Nós vem e se pega com ela, graças a Deus a gente faz uma viagem em paz e nada acontece com nós”, comenta satisfeita.

Dona Socorro é uma das centenas de devotas que vem de longe para prestar sua homenagem à Santa padroeira de Cruzeiro do Sul. Como de costume, todo início de agosto a capital do Vale do Juruá se prepara para o Novenário em honra a Nossa Senhora da Glória, a maior festa religiosa do estado do Acre e uma das mais importantes da Amazônia brasileira.

Dona Francisca do Socorro, 57, da comunidade 1o de Junho, no rio Gregório, em Tarauacá




Em sua 105ª edição, a tradicional celebração, organizada pela Diocese de Cruzeiro do Sul, teve como tema “Uma jovem chamada Maria”, um chamado da Igreja Católica à juventude do Vale do Juruá. Foram onze dias de celebração, entre 5 e 15 de agosto, que encerraram com a procissão em honra a padroeira.

É por volta das cinco horas da tarde que se inicia a peregrinação onde milhares de devotos, de vários lugares do mundo se juntam para percorrer as ruas do centro da cidade.

Nessa jornada, sobre os ombros dos fiéis, a santa “passa à frente”. Cada devoto com sua prece, de pés calçados ou descalços, caminha em passos constantes e desacelerados entoando cânticos à padroeira. Nas mãos, velas acesas e no semblante o sentimento de emoção, de promessa cumprida e muita fé!

No Morro da Glória, um dos pontos mais altos da cidade, e onde foi construída a primeira catedral de Nossa Senhora da Glória, alguns fiéis e curiosos esperam apreensivos a padroeira descer a ladeira do respectivo morro até seu destino, a famosa e icônica Catedral de Nossa Senhora da Glória, construída no coração de Cruzeiro do Sul. Sua cúpula pode ser avistada ao longe, desde as curvas e barrancos do rio Juruá. Logo, a frente da catedral é tomada pela multidão.

Encerrada a missa de celebração, aos poucos a multidão vai se dispersando. Quem mora na cidade, volta para o aconchego das casas. Quem fez a peregrinação pela floresta, precisa esperar o Sol raiar para voltar em segurança. Na beira do rio, canoas, catraias, bajolas e batelões sobem ou descem o Juruá no regresso para as comunidades ribeirinhas. E, assim, chega ao fim uma das festas católicas mais importantes da Amazônia. A expectativa, agora, é para os movimentos para o próximo agosto e seu sagrado Novenário de Nossa Senhora da Glória – a protetora do Juruá.


Após peregrinação, fiéis se concentram em frente à Catedral de Nossa Senhora da Glória, no centro de Cruzeiro do Sul








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