O CRIME COMPENSA

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Impunidade a criminosos ambientais ainda alimenta desmatamento

Agentes federais durante operação na Resex Chico Mendes, em Rio Branco; condenações a infratores acabam sendo a exceção (Foto: Divulgação)




Dos 3.551 processos movidos pelo programa Amazônia Protege, desenvolvido pelo MPF, e analisados pelos pesquisadores do Imazon, apenas 650 (18%) tinham sentenças até outubro de 2020 e 51 delas foram procedentes. Ou seja: as condenações correspondiam a 1% do total de ações e a 8% das sentenças.



dos varadouros de Rio Branco

Fazer os criminosos pagarem pelo desmatamento ilegal da Amazônia e recuperarem o dano é um dos principais desafios da Justiça na área ambiental. Estudo do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), divulgado nesta sexta-feira, 31, analisou mais de 3,5 mil ações civis públicas (ACPs) ajuizadas pelo Ministério Público Federal (MPF). A conclusão é a de que as condenações aumentaram, mas que apenas 5% delas resultaram, definitivamente, em indenizações pagas. Além disso, não há garantia de que as multas quitadas sejam aplicadas no bioma.

Os resultados dos estudos mostram que, infelizmente, a impunidade ainda é uma grande característica neste submundo dos crimes ambientais contra a preservação da maior floresta tropical do mundo. Enquanto o Estado não consegue punir estes criminosos, a Floresta Amazônica continua a ser pressionada, ano após ano, pelo avanço do desmatamento que coloca em risco a sobrevivência do bioma – e das populações que nele vivem.

Apesar da intensificação na realização de operações policiais no combate aos crimes ambientais na Amazônia, quando os inquéritos chegam à esfera do Poder Judiciário poucos são os resultados concretos de condenações. Como muitas das vezes fica inviável identificar os autores dos delitos, os magistrados precisam julgar ações de réus incertos. Uma tese motivo de polêmicas dentro da Justiça – o que leva muitos juízes a nem mesmo avaliar o caso. Ao propor ações mesmo sem identificar os autores, o MPF tenta, assim, ao menos obter o embargo das áreas desmatadas para que não sejam ocupadas pela atividade agropecuária.

A pesquisa acompanhou a movimentação de ACPs movidas pelo MPF entre 2017 e 2020, nas primeiras três fases do Programa Amazônia Protege. Elas pedem a responsabilização por desmatamento ilegal do bioma na esfera cível, onde é possível cobrar indenizações por danos materiais e morais e ainda determinar a recuperação da floresta. Essa é uma das três formas de responsabilização por dano ambiental previstas na legislação brasileira, além das esferas administrativa e criminal.

Foram analisadas 3.551 ações pelo estudo, que envolvem 265 mil hectares desmatados e pedem mais de R$ 4,6 bilhões em indenizações. Até dezembro de 2023, 2.028 ações (57% do total) tinham sentença, sendo 695 com algum tipo de responsabilização. Elas se dividem em 640 ações julgadas procedentes, considerando decisões após o julgamento de recursos, quando juízes ou tribunais aceitaram pelo menos um dos pedidos de responsabilização do MPF, e em 55 Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), quando os responsáveis pelo desmatamento ilegal se comprometeram a adotar medidas de reparação. Somadas, as condenações e os TACs correspondem a 20% do total de processos e a 34% das ações com sentenças.

“É positivo ver o aumento de casos procedentes para responsabilização de desmatadores e que os tribunais têm mantido entendimento favorável à condenação nessas ações que utilizam provas obtidas de forma remota, com imagens de satélite e uso de banco de dados. O desafio agora é obter o efetivo pagamento das indenizações e a recuperação das áreas que foram desmatadas”, afirma Brenda Brito, pesquisadora do Imazon e uma das coordenadoras do estudo.

Apesar das condenações não serem a maioria entre as decisões, o dado representou um aumento nas responsabilizações. Em um estudo anterior do Imazon, dos 3.551 processos analisados, apenas 650 (18%) tinham sentenças até outubro de 2020 e 51 delas foram procedentes. Ou seja: as condenações correspondiam a 1% do total de ações e a 8% das sentenças. A maioria das decisões pela responsabilização dos desmatadores (449 casos) ocorreu após outubro de 2020, especialmente em 2023, quando houve 241 sentenças procedentes.

Apesar do avanço nas punições, o cumprimento delas ainda é muito baixo. Conforme a pesquisa, das 640 sentenças procedentes após julgamento de recursos e dos 55 TACs firmados, que determinaram indenizações de R$ 251,9 milhões, somente 37 (5%) tiveram as indenizações quitadas. As dívidas pagas somam R$ 652,3 mil (0,5%) e se referem a três sentenças e a 34 termos. Se considerar os casos em fase de pagamento, com bloqueio em contas bancárias dos réus ou pagamento parcelado, esse percentual sobe para 8%.

Outro problema identificado na pesquisa foi a falta de garantia da aplicação das indenizações no bioma. Embora o MPF tenha solicitado a destinação dos valores aos órgãos ambientais na maioria das ações, os fundos públicos foram o destino majoritário das sentenças, como o Fundo de Direitos Difusos e o Fundo Nacional de Meio Ambiente.

“Resoluções e recomendações do CNJ já permitem direcionar esses valores para atividades na Amazônia, o que seria o ideal. Por exemplo, com repasses para instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos que realizem projetos de recuperação de vegetação nativa ou para o combate às queimadas. Para isso, os tribunais e o MPF precisam publicar editais de convocação para cadastro e análise de projetos”, comenta pesquisadora do Imazon.

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