POLÍTICAS EXTREMAS

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Em ano de clima e poluição extremos, rio-branquenses vão às urnas

A capital dos extremos: em 6 meses, moradores da capital acreana conviveram com dois eventos climáticos extremos: uma grande enchente e uma seca severa (Foto: Juan Diaz)



Prestes a escolher seus novos representantes na prefeitura e Câmara Municipal, moradores da capital do Acre ainda convivem com efeitos de grave crise climática-ambiental. Cidade permanece encoberta pela fumaça das queimadas. Rio Acre ainda está em nível crítico de vazante – após ter alcançado a segunda maior enchente da história em março. Ambiente político dominado pelo bolsonarismo ofuscou ‘novo normal’ do debate eleitoral.



Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco


A semana que antecede o dia da votação para a escolha dos novos representantes municipais em todo o país pode ser definida como um resumo da grave crise climática e da poluição extrema que afeta a população da capital acreana desde o começo do ano. Da esperança de dias melhores ao voltarmos a ver o azul do céu e respirarmos um ar puro, tudo voltou a ser um pesadelo com a cidade novamente invadida pela fumaça das queimadas, que colocam Rio Branco entre as cidades mais poluídas do mundo pelos sistemas internacionais de medição da qualidade do ar. Nem mesmo as chuvas recentes são capazes de dar tréguas ao fogo e à sequidão.

Vivemos um verão severo e prolongado que se arrasta por outubro, e leva as pessoas a continuarem botando fogo em áreas de vegetação. Chamas que saem do controle e adentram numa floresta ressecada sem chuvas. Se não muito longe no passado, o mês de outubro trazia consigo as primeiras águas de nosso inverno amazônico – infelizmente esta não é mais a realidade. O rio Acre permanece em nível crítico de vazante. Ele mede 1,36 m neste sábado.

Em 21 de setembro, o manancial alcançou a marca mais baixa registrada em cinco décadas de aferições: 1,23 m. Um extremo quando comparado a seis de março último, quando ele esteve na marca dos 17,88m – a segunda maior alagação da história. Isso porque, em 2023, o rio também já tinha alcançado a segunda maior enchente. Em menos de 12 meses, o rio Acre bateu recordes sucessivos de enchentes. São tantas as alegações que já perdemos as contas – e estejamos achando “normal”.



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Além do rio Acre, a capital acreana passou a ser impactada pelas enxurradas dos igarapés. A cidade que cresceu de forma desordenada às margens destes mananciais se vê às voltas com seus transbordamentos (agora) frequentes. Nos últimos quatro anos, foram dois transbordamentos de igarapés como São Francisco, Batista e Fundo. São eventos climáticos extremos quase banalizados aqui por estas bandas da Amazônia Ocidental brasileira. Saímos de uma enchente, entramos numa seca – e vice-versa.

E este tem sido o “novo normal” climático vivido pelos quase 390 mil habitantes. Situação agravada pelas queimadas e incêndios florestais intensificados nos anos mais recentes. Um cenário que, além de causar uma devastação imensurável à fauna e à flora, leva os rio-branquenses a inalar um ar com elevadíssima concentração de material tóxico. Uma contaminação que por vezes fica acima 50 vezes acima do recomendado pelas autoridades internacionais de saúde. Uma contaminação que leva milhares aos hospitais por problemas respiratórios.

E o cenário político do Acre contribui (sempre pode piorar?) para potencializar, ainda mais, este clima fora dos padrões vividos por nossos pais e avôs. Se antes tínhamos um calendário certinho entre inverno e verão, tudo isso está apenas nas recordações. A consolidação da extrema-direita como principal força política do Acre (a partir das eleições gerais de 2019), aprofunda-nos em alta velocidade rumo a este colapso e abismo ambiental-climático. E não sabemos se este poço tem fim.


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O desmonte das políticas ambientais pelo governador bolsonarista Gladson Cameli (PP), entre 2019 e 2022 levou o Acre a níveis recordes de desmatamento e queimadas. Em 2020, com a eleição do também bolsonarista Sebastião Bocalom (PL) para a Prefeitura de Rio Branco, fez com que a maior cidade acreana fosse ainda mais impactada pela crise ambiental – sobretudo a contaminação extrema do ar pela fumaça das queimadas. Juntos com Bolsonaro faziam vista-grossa a todos os crimes ambientais praticados.

E quando se analisa o atual cenário político-eleitoral, a tendência é a de que o negacionismo em nome do “desenvolvimento econômico” sobreviva por muito anos – e com apoio das urnas. É fato que desde 2022 Cameli se apresenta como amigo da floresta – após devastá-la à vontade durante o primeiro mandato. A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a Presidência da República obrigou o bolsonarista a adotar uma nova roupagem – agora, ecologicamente correta.

Desde 2019, com o desmonte das políticas ambientais, Rio Branco é fortemente atingida pela poluição das queimadas (Foto: Fabio Pontes/Varadouro)



A campanha do fogo


Mas a herança maldita de sua política da boiada (alinhada com a de Jair Bolsonaro) tem reflexos até hoje. As queimadas desenfreadas de 2024 podem ser reflexo disso. Mesmo com todos estes impactos, o tema da crise climática-ambiental continua muito distante das prioridades da classe política acreana – e de uma grande fatia do eleitorado.

A eleição municipal de 2024 é um retrato disso. Nem o fato de a população ter ficado por vários dias consecutivos “entalada” com a fumaça das queimadas fez o tema ambiental entrar na agenda dos debates. As próprias campanhas em via pública foram prejudicadas. Nos dias mais críticos da poluição, os eventos precisaram ser cancelados. Sebastião Bocalom até alegou problemas de saúde por causa da poluição para falta a um debate.

Os únicos candidatos a abordar a situação da crise ambiental foram Marcus Alexandre (MDB) e Janilson Leite (PSB). No Dia da Amazônia (5 de setembro) abordaram o tema da poluição das queimadas. O deputado estadual Emerson Jarude (Novo) não teve tempo na propaganda eleitoral.

O atual prefeito passou a campanha inteira agarrando-se à imagem de Jair Bolsonaro, apresentando-se como o “candidato do capitão” – sem dizer de fato qual o benefício de ser apoiado por um ex-presidente da República inelegível. Mas em se tratando de um território bolsonarista, passar a campanha inteira vestindo a blusa a Seleção e caçando comunistas rende muitos votos num território bolsonarista.

Tal ambiente tóxico fez o atual mandatário municipal se dar ao luxo de enviar para a lata do lixo o Plano Municipal de Mitigação e Adaptação às Mudanças do Clima (PMAMC) deixado por sua antecessora, Socorro Neri (PP). A cidade, que poderia ser uma referência na adoção de políticas para amenizar os efeitos dos eventos extremos, adota apenas ações paliativas e emergênciais quando se depara com tais situação.

Sim, esta é a nova realidade política política-eleitoral não apenas de Rio Branco, mas de grande parte dos municípios amazônicos.

O resultado que sairá das urnas neste domingo definirá os rumos de uma das cidades brasileiras mais afetadas pelos eventos climáticos extremos. Se de fato adotaremos políticas de estado que deixem a cidade mais adaptada, ou se continuaremos a enxugar gelo – nestas ondas de calor que não cessam, o gelo já derreteu tem tempo.

Mesmo com a capital e sua população intensamente atingidas pela crise climática, pouco ou nada foi tratado sobre o tema nas eleiçoes municipais (Foto: Juan Diaz)





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