Manchineri denunciam descasos da saúde indígena após morte de parteira do povo

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Maria Manchineri, liderança Manchineri, vítima da omissão histórica do país com os povos indígenas (Foto: Cedida)



dos varadouros de Rio Branco

A parteira e curadora tradicional Maria Artur Manchineri morreu na última quinta-feira (26) em circunstância que indignou a comunidade da aldeia Extrema, na Terra Indígena Mamoadate, em Assis Brasil, onde vivia. Falecida aos 58 anos, Maria foi vítima de um câncer no fígado, mas, como afirmam seus parentes, “também da ineficiência do sistema público de atenção à saúde dos povos indígenas”.

Segundo consta, Maria deixou a aldeia no dia 1º de julho para fazer um tratamento em Assis Brasil após encaminhamento médico da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), órgão subordinado ao Ministério da Saúde. Na cidade, ela passou dois meses na casa de uma das suas filhas tentando o acompanhamento pela equipe da Sesai e, como não conseguiu, viajou ao Peru. Após ser consultada e medicada no país vizinho, retornou no dia 3 de setembro para sua aldeia.

Os dias seguintes foram difíceis e, no dia 24, ela piorou e foi removida para Assis Brasil de helicóptero. No dia 25, o médico brasileiro concedeu alta para ela retornar para a casa da sua filha em Assis Brasil, mas novamente o quadro se agravou. Houve pressão das lideranças para agilizar o atendimento, porém Maria não resistiu e morreu.

Em nota, os lideres da Associação Manxinerune Ptohi Phunputuru Poktshi Hajene (MAPPHA), Lucas Artur Brasil Manchineri e Mailson Romão Artur Manchineri relatam que familiares reivindicaram o translado do corpo pela via aérea até a comunidade, mas isso não havia acontecido três dias depois.

“Hoje, 28 de setembro, a equipe da Sesai alegou que não teve condição de levantar o voo por conta da neblina de fumaça das queimadas que afetam gravemente todo o Acre nas últimas semanas. O corpo de Maria saiu então de Assis Brasil às 4 horas da manhã deste sábado, pelo Ramal do Icuriã. Quando chegou na margem do rio Iaco não tinha barco e o motor que estava quebrado”, contam Lucas e Mailson, respectivamente presidente e vice da MAPPHA.

“Essa situação de descaso na atenção à saúde no nosso município não é de agora. É muito recorrente as vezes que nós mesmos pagamos as passagens, os medicamentos e as consultas de médicos na cidade. Esperamos que as autoridades responsáveis pela Saúde Indígena no Brasil não permitam que essa situação persista”, afirmam os líderes Manchineri.

“A morte de Maria não foi a última evidência da maneira desrespeitosa com que o Brasil trata os povos indígenas. A família pediu que o corpo fosse levado de helicóptero para a aldeia Extrema, onde morava, para os ritos funerários, mas o voo foi impedido por causa da fumaça das queimadas que cobre o estado do Acre há mais de 2 meses. Maria teve que fazer a última viagem de barco pelo rio Iaco tristemente castigado pela maior estiagem em 40 anos na Amazônia”, completa nota emitida pela Organização Observatório dos Povos Indígenas Isolados.

Em Assis Brasil, a saúde nas aldeias nas cabeceiras dos rios Acre e Iaco é de responsabilidade do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) do Alto Rio Purus, sediado em Rio Branco. Geralmente, os pacientes em estado grave para todos os tipos de casos são transferidos para Rio Branco, onde há uma Casai. No caso de Maria, ela poderia receber atendimento no Hospital do Câncer da capital, mas precisou ir ao país vizinho.


Sobre Maria Manchineri

Mãe de 10 filhos, avó de 21 netos e bisavó de 3 bisnetos, Maria Artur Manchineri fez a sua passagem no último sábado, 26 de setembro vítima de câncer. Ela tinha apenas 57 anos, porém deixa um grande legado para o seu povo. Ela teve uma vida dedicada a trazer crianças ao mundo e a curar doentes na Terra Indígena Mamoadate, a maior demarcada do Acre, que abrange os municípios de Assis Brasil e Sena Madureira. Além disso, era uma ativa defensora dos direitos dos povos indígenas, como mostra a foto que ilustra a reportagem.

Na ocasião, ela participava de um protesto contra as péssimas condições das escolas da educação indígena no território Mamoadate, situação relatada por Varadouro em maio deste ano.

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