Dos varadouros de Rio Branco
A casa da liderança do acampamento Marielle Franco, Paulo Sérgio Araújo, foi queimada na tarde desta terça-feira, 27, após a ação de jagunços na zona rural do município amazonense de Lábrea, localizado na tríplice divisa Amacro: Amazonas, Acre e Rondônia. Desde 2019, a região se tornou palco de intensos e violentos conflitos fundiários com casos de tortura e tentativa de homicídio.
O acampamento Marielle Franco fica vizinho à Fazenda Palotina, de propriedade de Sidney Zamura. A área ocupada por mais de 200 famílias é reivindicada pelo fazendeiro como parte de suas propriedades. Já os agricultores afirmam que a terra é de propriedade da União e pedem que ela seja transformada em assentamento pelo Incra.
A queima de casas e barracos das famílias de agricultores por jagunços é uma prática rotineira na região – isso quando não são alvo de disparos de armas de fogo. As famílias acusam o fazendeiro de contratar a jagunçada para ameaçá-los e intimidá-los – prática que ele nega.
O caso mais recente de violência aconteceu no começo de março, quando homens armados e vestidos de preto, que se identificaram como policiais do Bope, torturaram agricultores com golpes de facão e socos e pontapés. As vítimas não souberam informar se seriam policiais do Acre ou do Amazonas.
Na região é comum denúncias de que policiais dos dois estados estariam fazendo o trabalho de segurança particular aos fazendeiros.
As famílias de posseiros denunciam que a área é constantemente vigiada pelos fazendeiros com o uso de drones. A família de Paulo suspeita que eles viram o momento em que o rapaz que estava no imóvel saiu, e aproveitaram para atear fogo. No incêndio, os dois cachorros de estimação da liderança que estavam presos debaixo da casa morreram.
A família diz ter certeza que o incêndio foi criminoso pois não havia registros de queimadas no entorno – uma prática comum nesta época do ano na zona rural.
Em março, Paulo Sérgio foi preso por ordem do juíz da comarca de Lábrea por supostamente ter ameaçado o fazendeiro Sidney Zamura. Paulo chegou a ficar quase um mês preso, sendo transferido até para Manaus. Hoje ele cumpre prisão domiciliar em Rio Branco.
Os muitos casos de violências e violações de direitos humanos na região do acampamento Marielle Franco chamaram a atenção das autoridades. Uma equipe da Corregedoria do Tribunal de Justiça do Amazonas chegou a ir a campo para averiguar denúncias de irregularidades e possíveis grilagens de terras públicas.
Mesmo após intervenção do Tribunal de Justiça do Amazonas na região, que investiga possíveis fraudes no cartório de Lábrea, a divisa entre Amazonas e Acre permanece um barril de pólvora. A atuação de homens armados que circulam livremente e impunes impõe a lei do faroeste amazônico.