Madeireiras e seca extrema pressionam sobrevivência de indígenas isolados na fronteira do Peru com o Brasil
Mashco Piro foram avistados em praias próximos a aldeias de indígenas já contactados, em território peruano. Atividade madeireira com selos verdes pressionam com abertura de ramais que invadem os territórios ocupados por grupos isolados. Organização pede fim das operações madeireiras na região.
Dos varadouros de Rio Branco
Imagens inéditas divulgadas ontem (16) mostram dezenas de indígenas isolados do povo Mashco Piro na Amazônia peruana, a poucos quilômetros de áreas destinadas à exploração de madeira. Indígenas isolados são aqueles que evitam contato com pessoas de fora. Ativistas dizem que as imagens exibem a necessidade urgente de revogar todas as licenças de exploração de madeira na área e reconhecer que o território pertence aos Mashco Piro. A organização não-governamental Survival estima que eles sejam o maior povo de indígenas isolados do mundo.
A fronteira do Brasil com o Peru tem uma das maiores concentrações de povos indígenas em isolamento voluntário. É comum o relato de grupos indígenas acreanos relatarem a aproximação dos “parentes bravos”. Os Manxineru e Jaminawa da TI Mamoadate estão entre os que mais relatam essa aproximação e até o avistamento dos grupos.
Segundo os especialistas, essa época do ano, quando o período seco se intensifica, é quando há os maiores casos de quase contato pelos indígenas isolados. Eles aproveitam os níveis secos dos rios para pescar e caçar tartarugas e coletar seus ovos. Os verões mais secos e extremos dos últimos anos deixam estes grupos ainda mais vulneráveis. A atividade madeireira descontrolada no território peruano aumenta as pressões.
Nos últimos dias, mais de 50 indígenas Mashco Piro apareceram perto da aldeia dos indígenas Yine de Monte Salvado, no sudeste do Peru. Em um outro avistamento, um grupo de 17 indígenas apareceu na aldeia de Puerto Nuevo. Os Yine, que não são isolados, falam uma língua parecida com a dos Mashco Piro. Eles já haviam relatado anteriormente que os Mashco Piro reclamaram da presença de madeireiros em suas terras.
Várias empresas madeireiras detêm concessões dentro do território peruano que pertence aos Mashco Piro. A concessão mais próxima fica a poucos quilômetros de onde as recentes imagens dos Mashco Piro foram feitas.
A empresa Canales Tahuamanu, que opera no território dos Mashco Piro, construiu mais de 200 km de estradas para seus caminhões transportarem a madeira extraída. Ela é certificada pela FSC (Forest Stewardship Council), um selo de aprovação que pode ser encontrado em milhares de produtos feitos de papel, por suas operações supostamente sustentáveis e éticas, apesar do governo peruano ter reconhecido, há oito anos atrás, que a empresa está extraindo madeira no território dos Mashco Piro.
A Survival International está pedindo à FSC para cancelar a certificação concedida à Canales Tahuamanu. Mais de 8.000 pessoas ao redor do mundo já enviaram emails pressionando a FSC.
Alfredo Vargas Pio, presidente da Federação Nativa do Rio de Madre de Dios e Afluentes (Fenamad) afirma: “Esta é uma evidência irrefutável de que muitos Mashco Piro vivem nesta área que o governo, além de não conseguir proteger, vendeu para empresas madeireiras. Os trabalhadores podem trazer novas doenças que seriam mortais aos Mashco Piro, e também há risco de violência de ambos os lados. Por isso é muito importante que os direitos territoriais dos Mashco Piro sejam reconhecidos e protegidos por lei.”
“Essas imagens incríveis mostram que um grande número de indígenas isolados Mashco Piro vive a poucos quilômetros de áreas concedidas à exploração de madeira. Inclusive, a empresa Canales Tahuamanu já está trabalhando dentro do território dos Mashco Piro”, afirma a diretora da Survival International, Caroline Pearce
“Está se formando o cenário de uma verdadeira crise humanitária – é absolutamente necessário que os madeireiros sejam removidos, e que o território dos Mashco Piro seja devidamente protegido. A FSC deve cancelar imediatamente a certificação da Canales Tahuamanu – se não, ficará claro que todo o sistema de certificação é uma farsa.” (Com informações da Survival International)