No Acre, crise climática tende a estar em pauta central nas eleições municipais
Ambiente político dominado pela extrema-direita negacionista, todavia, pode emperrar debate sobre políticas ambientais que adaptem as cidades ao “novo normal” climático. Prefeito bolsonarista de Rio Branco, por exemplo, continua a culpar a preservação da floresta por possível pobreza no campo – realidade que sua gestão não conseguiu mudar.
Fabio Pontes
dos varadouros de Rio Branco
Com as cidades acreanas impactadas ano após ano com eventos climáticos extremos, tendo as suas populações urbana e rural afetadas por grandes e constantes alagações e secas, a apresentação de propostas por parte dos candidatos a prefeitos e vereadores que venham a amenizar esses danos podem (e precisam) estar no centro dos debates nas eleições municipais de 2024. E este é um ano bastante propício para uma agenda mais ambiental na disputa eleitoral. Entre fevereiro e março, 19 dos 22 municípios acreanos decretaram situação de emergência por causa das enchentes. Agora, o desafio é lidar com a estiagem severa e prolongada que coloca em risco a segurança hídrica e alimentar das comunidades.
A crise climática e as propostas dos candidatos e candidatas para adaptar as nossas cidades ao “novo normal” serão as coberturas centrais do jornal Varadouro nas Eleições 2024. Em meio a tantos impactos que atingem sobretudo as populações mais pobres, os gestores acreanos não podem ficar apenas com medidas paliativas, quando o estrago já aconteceu. Distribuir sacolões ou água mineral são medidas urgentes necessárias, sim, mas não as únicas.
De nada adianta atuar só com ações emergenciais no momento da crise, e devolver as famílias para as mesmas áreas de risco às margens de rios e igarapés – até a chegada da próxima alagação. Adaptar as cidades a uma nova realidade de eventos climáticos extremos precisa ser uma ação de Estado, uma política pública definida por lei. E não basta ser uma lei morta.
É o caso da capital, o município mais populoso do estado, com seus 364 mil habitantes. Em menos de um ano, Rio Branco foi atingida por duas grandes inundações do rio Acre – a segunda e a terceira maiores da história. Em 2023, a cidade ainda sofreu com as alagações dos igarapés. Uma grande seca também castigou os rio-branquenses logo em seguida. O mesmo filme se repete agora em 2024.
A capital acreana é um dos poucos municípios do país a possuir um Plano Municipal de Mitigação e Adaptação às Mudanças do Clima (PMAMC), Construído durante a gestão de Socorro Neri (2018-2020), o documento tem o objetivo de nortear as ações da prefeitura para deixar a cidade mais resiliente ao “novo normal” climático. Mesmo com todos os extremos ocorridos em tão pouco tempo, o atual prefeito, Tião Bocalom (PL), mandou o PMAMC para a lixeira.
Bolsonarista, Bocalom é um negacionista historicamente contumaz. Suas posições políticas sempre foram de privilegiar o agro e atacar as políticas de preservação ambiental. Junto com o desmonte das políticas ambientais promovido pelo governador Gladson Cameli (PP), durante o seu primeiro mandato (2019-2022), eles transformaram Rio Branco na “capital do fogo”.
Nesta semana, durante evento de empreendedorismo, Bocalom voltou a atacar a preservação ambiental. Afirmou que “a floresta em pé” é a responsável por deixar os produtores rurais na miséria. Bocalom criticou o fato de que, conforme seus números, 40% dos rio-branquenses dependem de programas de transferência de renda. O número é falso, conforme checagem feita por Varadouro, junto ao portal do Ministério do Desenvolvimento Social.
Segundo os dados, em junho passado 44.279 famílias de Rio Branco receberam o Bolsa Família – número que corresponde a 12,14% da população total. Bocalom criticou a falta de políticas que gerem oportunidade de renda. Ele e seu grupo político estão há seis anos no poder, e não conseguiram colocar em prática políticas de crescimento econômico com inclusão social. Após ficar 20 anos fazendo oposição ao PT, Bocalom se esquece que agora ele é o gestor – e não consegue sair do palanque.
Junto com seus aliados Gladson Cameli e Jair Bolsonaro (PL) derrubaram a floresta em nome do agronegócio, e mantiveram o Acre na pobreza. Durante o trágico período da política da boiada, o Acre apresentou níveis recordes de desmatamento e queimadas na Amazônia.
Paralelo a isso, a crise climática só se intensificou, e como mostram as análises científicas a tendência é só se agravar. O cenário político-ambiental acreano é preocupante com a consolidação, no poder, da extrema-direita negacionista, que a todo custo culpa a floresta pela pobreza que eles próprios mergulham a população acreana. Para este grupo, só a floresta transformada em pasto pode “tirar o Acre do atraso”.
O que essa gente não entende é que, sem floresta em pé, a agricultura não sobrevive num ambiente de sertão.
E assim, do Alto Acre ao Alto Juruá, as populações acreanas são afetadas pelos eventos climáticos extremos. Nas cidades, bairros inteiros ficam inundados. No caso de Brasiléia, quase toda a cidade. No campo, ribeirinhos perdem roçados inteiros nas enchentes. Na seca extrema, falta-lhes água até para beber – imagina para a irrigação.
As eleições municipais já vão começar. Será a oportunidade para eleitores e eleitoras cobrarem dos candidatos propostas concretas que amenizem os efeitos da crise climática. Estamos à beira de um colapso no fornecimento de água potável por causa da seca. O negacionismo e a ignorância não podem mais prevalecer em nosso ambiente político.
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