MPF quer anulação de blocos de exploração de petróleo no ‘Leilão do Fim do Mundo’

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(Foto: Divulgação)




dos varadouros de Manaus


A ação civil pública interposta pelo Ministério Público Federal (MPF) pede a anulação da concessão de quatro blocos exploratórios de petróleo e gás na Bacia Sedimentar do Amazonas, bem como a Área de Acumulação Marginal do Campo do Japiim, arrematados em dezembro do ano passado no chamado ‘Leilão do Fim do Mundo’. A área está localizada no leste do Amazonas, entre os municípios de Careiro e Careiro da Várzea. Seis terras indígenas e ao menos 11 unidades de conservação estão sob impacto direto da exploração mineral; Comunidades tradicionais foram desconsideradas e não consultadas.

O 4º Ciclo de Oferta Permanente de Concessão promovido pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) em 13.12.23 ganhou esse apelido pela quantidade de blocos ofertados – 21 ao todo -, sendo muitos deles em áreas de impacto socioambiental na Amazônia.

Não bastasse o agravante, o leilão foi realizado no mesmo dia da divulgação do texto final da Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP28) em que mais de 200 países se comprometeram com uma transição dos combustíveis fósseis até 2050.

O campo com acumulação marginal de combustíveis fósseis de Japiim foi arrematado pela Eneva SA e pela Atem Distribuidora, que também adquiriu os quatro blocos exploratórios na região. Além das empresas, a ação foi proposta contra a União e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que promoveram o leilão.

De acordo com laudos periciais produzidos pelo MPF, a exploração na área concedida tem o potencial de impactar seis terras indígenas e ao menos 11 unidades de conservação, sem que as comunidades envolvidas tenham sido consultadas sobre os possíveis efeitos em suas terras.

Conforme documento técnico, o bloco AM-T-107 impacta as TIs Gavião, Lago do Marinheiro, Ponciano e Sissaíma, do Povo Mura, em Careiro e Careiro da Várzea. Os territórios estão em fase de regularização ou declaração. No AM-T-133, o impacto da exploração de combustíveis fósseis se dá na TI Coatá-Laranjal, dos Munduruku, em Borba, que está em regularização. O bloco também interfere na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Canumã.

Já os blocos AM-T-63 e AM-T-64 têm interferência na Área de Proteção Ambiental Nhamundá. O segundo bloco incide ainda na Floresta Nacional Saracá-Taquera, segundo o MPF.

Por conta dos impactos preliminares decorrentes da exploração de petróleo e gás, cuja interferência já se faz presente desde a fase de pesquisa de viabilidade econômica das áreas arrematadas, o MPF pede, em caráter liminar, que seja suspensa a homologação e a assinatura dos contratos, e que as empresas vencedoras se abstenham de realizar qualquer atividade exploratória ou de estudo na região até que as comunidades indígenas e ribeirinhas potencialmente afetadas sejam efetivamente consultadas sobre os impactos dos empreendimentos.

O órgão sugere que se estime R$ 7,8 milhões como valor da causa, quantia correspondente ao bônus total ofertado pelos blocos. Há, desde 2015, recomendação do MPF à ANP para que fossem retirados dos leilões na Bacia Amazônica blocos cuja exploração tem potencial lesivo ao meio ambiente e às comunidades do entorno.

Para o MPF, permitir a exploração de locais próximos a terras indígenas, especialmente quando uma delas está pendente de demarcação, significa criar uma situação de insegurança jurídica para todos os envolvidos, pois, após a conclusão da demarcação, devem surgir novos conflitos pela posse e exploração, bem como custos para a própria União, especialmente se estiverem operando no local as empresas arrematantes.

O órgão alega que a área reivindicada pelos Maraguá deve ser recortada do bloco AM-T-133, dando-se preferência ao direito constitucional e originário indígena frente a pretensão empresarial, aplicando-se o princípio da precaução e suspendendo-se a arrematação do bloco enquanto não demarcada a área.

O direito dos povos indígenas e comunidades tradicionais de serem consultados previamente sobre a implementação de empreendimentos em suas terras está assentado na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.

“A experiência de consulta é um caminho sem volta. Não tem como fingir que ele não existe. É um avanço dos últimos anos; uma resposta ao autoritarismo”, afirmou Liana Amin Lima da Silva, pós-doutoranda em Direito pela PUC-PR, e uma das coordenadoras gerais do Observatório de Protocolos Comunitários Autônomos, em entrevista ao Varadouro em outubro de 2023.



Impactos preliminares

O MPF explica que a exploração de recursos como petróleo gera impactos ambientais antes mesmo da construção de eventuais empreendimentos. “Ao arrematar um bloco, o empreendedor não sabe o ponto exato em que o poço de exploração final será perfurado, devendo realizar estudos para a análise de viabilidade”, esclarece o órgão em trecho da ação. Assim, dentro de um só bloco, podem ser perfurados muitos poços até que se chegue a uma localização exata para a exploração final, o que já significa uma intensa interferência ambiental.

De acordo com o MPF, considerando-se o princípio da precaução, as consultas aos povos potencialmente impactados deveriam ter sido feitas antes da oferta das terras, e que a ANP em nenhum momento levou em consideração a presença dessas populações para decidir sobre o oferecimento dos blocos. O órgão acrescenta que explorações deste tipo trazem efeitos sociais e especulativos que alteram toda a dinâmica da região, aumentando as pressões sobre os territórios e, por consequência, facilitando o caminho para grilagens e invasões.

Quanto aos aspectos ambientais, a exploração da área concedida tem o potencial de impactar os modos de vida de milhares de pessoas, quando considerada a totalidade das terras indígenas e comunidades ribeirinhas envolvidas. São áreas extremamente sensíveis a acidentes ambientais, com alta densidade de fauna e flora, distribuídas em ecossistemas intrinsecamente relacionados aos modos de existência das comunidades que nelas habitam, o que enseja, para o MPF, uma análise mais aprofundada e cautelosa sobre a possibilidade de exploração. (Com informações Ascom MPF/AM)

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